São cápsulas, as coisas que guardamos num dado momento, a pensar num outro lá mais para a frente. Todos os frascos, todas as caixinhas. Vontades encapsuladas de guardar qualquer coisa de que se gosta muito ou que quer ser vivida o mais que pudermos. Do Mercado de Lagos, trago sempre pequenas cápsulas. Orégãos, flor-de-sal, pimentão doce, farinha de alfarroba, mel de flor de laranjeira, amêndoas. O Sr. Zé das especiarias e dos frutos secos enche um cesto, no último dia. Nunca vem só com aquilo que eu pedi. Ele arranja sempre mais qualquer coisa que só descubro inteiramente quando aqui chego. Para usar durante o tempo que me separa de Lagos, as tais cápsulas. Não num registo ensimesmado e hermético. É ao contrário. É muito ao contrário. Os ramos de orégãos que adornam um canto da bancada onde faço comida de todos os dias. Uma maneira de a memória sensorial andar uns bons quilómetros para sul. De repente, é a minha alegria solar em Lagos. Basta o aroma e o verde seco de um ramo de orégãos. Bem simples, a viagem.
Acontece assim com o molho de tomate feito algures em Setembro. Fica guardado um dia de Verão e depois liberta-se num dia de Outono ou de Inverno. Mais viagens no tempo, à conta destas caixinhas.
Fica uma massa muito simples. E a mesa que ela desencadeou. Com as cores e com a cadência de um Outono irrepetível: este. As coisas nunca são bem iguais. Orgânica e profusamente quente, a mesa. O azeite, o Parmesão, as folhas de orégãos, pão, uvas douradas, maçãs deste mês, um vinho do Douro, doce de tomate a querer ser conjugado com um bolo de maçãs e com café forte. A vida pode saber-nos mesmo bem, de vez em quando. Com tudo o que nos é amargo. Dizem que é assim que a vida sabe melhor. Com estes dois travos.
Massa
com molho de tomate e nozes
Esta receita de molho de tomate + esparguete (+/-metade de um pacote) + sal,
orégãos, queijo Parmesão e nozes q.b.
Coze-se
a massa em água com sal e com um fio de azeite. Depois, retira-se, passa-se por
água corrente e fria e reserva-se. Aquece-se o molho de tomate, junta-se a
massa e tempera-se com sal a gosto. Envolve-se muito bem. Pouco antes de
servir, uma mão cheia de Parmesão ralado e outra de orégãos. Envolve-se outra
vez e serve-se bem quente. Assim: massa, uma camada de Parmesão, nozes partidas
grosseiramente e mais um pouco de orégãos.
Uma mesa outonal linda... aqui registada pelos teus olhos e pelas tuas palavras sempre tão sábias :)
ResponderEliminarKiss
São estes pequenos prazeres que tornam a vida doce. Coisas guardadas em cápsulas, por exemplo. Ontem li um livro delicioso, intitulado O Livro dos Prazeres Inúteis. Sobre aqueles prazeres pequenos e gratuitos a que (infelizmente) nem todos sabem dar valor. Tu sabes, e muito :) E isso torna a vida bem menos amarga. Linda, (mais) esta mesa.
ResponderEliminarUm beijo,
Ilídia
Olá Sophy:
ResponderEliminarQue bom ler-te. Que bom que tenhas gostado da mesa para o Outono.
Um beijo. Ou dois, que já sei que é dose dupla de beijos:)
Mar
Olá Ilídia:
ResponderEliminarEsse livro também anda aqui. No wonder:) E sim, a vida sabe melhor com coisas ao alcance. Como ter coisas guardadas dentro de frascos. Uma mesa. E fazer comida para as nossas pessoas. Como tu, que fizeste um bolo sem ovos para os teus dois homens desconsolados, ante a possibilidade de não haver bolo de chocolate por não haver ovos em casa:)
Obrigada por teres gostado de (mais) esta mesa.
Um beijo.
Mar
Adoro esses rituais de fechar em frascos memórias, cheiros e sabores para usar depois. Vou fazer esta massa. Já jantei, mas acho que se a tivesse à minha frente comia outra vez!
ResponderEliminarUm beijo
Babette
Estes rituais são cumpridos todos os anos. As coisas que vêm de Lagos. E as coisas que vão guardando o ar que vamos respirando.
ResponderEliminarBom apetite!:)
Um beijo.
Mar