Regressar.




























Gosto das duas coisas. De desaparecer. E de voltar. Muito das duas coisas. Talvez por isso nunca suporte muito tempo longe de casa. E não é que seja uma coisa de rotina. Ou por sentir falta de coisas que há aqui e que não há lá fora. E então, regressar sabe sempre a coisas de sempre. Mas com coisas que não havia antes. Porque antes não havia os lugares e as pessoas e as coisas que foram vividas entretanto. Por isso, volta-se diferente. E eu gosto muito de pensar que melhor. Que voltamos melhor. Nada de muito elaborado. Ou fora do comum. Normalíssimo, até. Mas as coisas que há aqui. A luz que só há aqui. O vento que já é de Outono. O calendário até pode dizer que não, mas eu acho que sim. Que já há qualquer coisa de Outono. Talvez na maneira como a luz declina, ao fim do dia. Talvez na maneira como se sente o vento que já é da altura do ano em que as cores são em tons vivos pré-morte. Cores a antecipar a morte temporária do Inverno.
O meu regresso soube a doce de figos. Um doce que não foi feito pelas minhas mãos. O doce de figos foi uma boa-vinda. Da minha Dª Maria José. A pessoa que me ajuda a manter a ordem aqui. Que cuida da minha casa comigo. E que fez um doce de figos delicioso na minha ausência. E assim, num destes dias, a minha Dª Maria José acordou-me assim. A dizer que havia um frasco enorme de uma coisa que significa coisas boas. A tempo de pequeno-almoço. Coisas ditas assim. De uma maneira doce. E com uma luz que já é de fim de Verão. Está quase. Quase o fim do Verão lá fora.
Ela deu-me permissão para partilhar a receita do doce que me soube a regresso. E que eu agradeço. Por ter sido doce, o regresso.

1 quilo de figos (não muito maduros) + 1 quilo de açúcar + sumo de meio limão.

Primeiro, faz-se uma calda com o açúcar. Até atingir ponto de pérola. Quando acontecer, junta-se os figos com cuidado e deixa-se até a calda chegar a ponto de fio. Retira-se do lume e espreme-se o sumo de meio limão. Deixa-se arrefecer e coloca-se em frascos.
Este doce é bom de todas as maneiras. Sabe bem à mesa de pequenos-almoços ensonados:) e como sobremesa, quando acrescentado a gelado de natas ou de baunilha.


























No jardim, onde anda o gatinho sem nome que também deu as boas-vindas. À maneira dele. Entra como se o lugar lhe pertencesse. Olha-me ao longe e depois começa a parte em que pede miminhos. E pronto. Teve os miminhos que queria. As boas-vindas do gatinho sem nome são assim. Com pedidos sem palavras. Depois desapareço. Para ele ficar em paz a beber as saudades todas que teve. No jardim que lhe pertence. Fazer o quê? Os gatos são felinos. Não conseguimos tê-los. Não conseguimos domesticá-los. Bom assim. Que sejam livres. E que peçam os mimos que entenderem.
E Radiohead. Música para regressar. A que regressar sempre. Everything in its right place.

8 comentários:

  1. É tão bom partir e tão bom regressar. Partilho dos mesmos sentimentos de viajante: a ansiedade de partir, a antecipação de ver, aprender e conhecer, a saudade e a alegria do regresso. O conforto da nossa casa, daquela que tem os nossos cheiros, os nossos sitios e que alberga tudo quanto ganhamos com as partidas. Só não tenho um gatinho sem nome...
    Beijinhos

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  2. Olá, Mar. Tantas coisas em comum num único post. Em primeiro lugar, este amor pela Casa. Também gosto tanto de regressar de férias. Trazer memórias, vivências, alguns objetos. Depois, esta antecipação pelo outono. Também não sou daquelas pessoas que queriam que fosse verão todo o ano. Gosto de todas as estações. E o outono é tão belo. Estas férias andei a arrumar revistas. Entre as quais a Vogue e a Elle. Alguns exemplares dos anos 90. Não resisto a folheá-las. E não me consigo desfazer delas. Continuam guardadas. Quem sabe se alguém, daqui a uns anos encontrará as revistas de moda que a avó lia :) talvez seja por lermos revistas de moda que costumamos antecipar as estações frias :) Finalmente, o doce de figo. Figo é o meu fruto preferido. Um dos meus úlitmos posts é sobre este fruto. Usei-o em pizza, este ano. E gostei do resultado.
    Bem, vou terminar. Não consigo ultrapassar esta minha tagarelice :)
    Beijos

    P.s. Gostei da imagem do gatinho a "beber as saudades todas que teve". Tenho dois gatos, o Gaspar e a Micas. Qualquer dia, mostro-os.

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  3. Mar:
    Tão bonito tudo o que escreve. E sempre que a leio, encontro tantos motivos para (re) descobrir coisas boas da vida.Vivemos em grupo, não é? Isso cria uma grande responsabilidade, até à distância podemos dar momentos especiais aos que nos procuram. Vir ao seu blog é esperar ler estes textos, de que é um bom exemplo o de hoje.
    Beijinhos e uma festinha a esse felino de bom aspecto.

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  4. Eu também gosto tanto de ir como de voltar. Porque gosto muito de acrescentar mundo, mas também do refúgio que é a nossa casa. "My home is my castle". E então se nesse castelo estiver tão distinto doce de figo... Sabes que partilhamos (e com a Ilídia também!...) esse amor pelos figos!
    Um beijo de início de semana. Que já parece mesmo de Outono...
    Babette

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  5. Olá Carla:

    Muito assim como formulou. Com essa poesia toda. A nostalgia do viajante que há em cada um de nós e a nostalgia dos lugares de sempre. Que são os que nos acolhem sem pedir retorno. Estão aqui. À espera. Como se pudéssemos ir sempre. Para muito longe. Para mais perto. E sempre aqui. À espera do regresso. Com o melhor de ir. Que é voltar mais. Com mais.
    E o gatinho sem nome não é meu. É impossuível, como tudo aquilo que é belo e maior do que nós. E é só um gato. Sem nome. Mas que me acolheu sem mais.

    Um beijo de obrigada. Pelas coisas lindas que escreveu.

    Mar

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  6. Olá Ilídia:

    Em casa, que me sinto. Ao lê-la. Aqui. E no seu blog. Guardei essas entradas em que falava do seu sentido de casa. Das revistas que andou a arrumar. Da antecipação do Outono, ao cumprir uma série de pequenos rituais de formiguinha. Encontrei-me e às coisas em que penso no que escreveu. Por também ter andado a arrumar revistas antigas. Por gostar de antecipar os dias em que depois não há o tempo de agora. E sim. Gostar de todas as estações. Por não ser particularmente nostálgica em relação a uma em especial. Posso ser feliz nos dias de sol. E nos de chuva. Com neve lá fora. Ou com as flores todas da Primavera. O que há em nós é que é importante. Os factores externos são só isso. Externos. Somos nós que determinamos e pronto.
    Por esta altura, as revistas. Gosto muito de ir olhando as coisas dos dias frios. Já sabe, não é? Aquilo dos sapatos e das outras coisas todas. É possível gostar muito de fazer comida e de casa. E as outras coisas também. Para baralhar as leituras apressadas que gostam de rótulos. Um ritual de fim de Verão. Contemplar a beleza em páginas de revistas. Vogue. Elle. Harper's Bazaar. Vanity Fair. Tudo o que nos apetecer de beleza. E a pensar também nisso. Para que à distância de anos, alguém saiba que as avós tinham bom gosto:) A par de gostarem de fazer bolos e biscoitos e outras coisas que marcam as memórias que não são como as revistas. De folhear.
    Acho que consegui ser bem mais tagarela, não?:) Gosto muito da tagarelice da minha Ilídia dos Açores. Apetece-me a reciprocidade.

    Um beijo. E sim. Gostávamos muito de ver os seus gatinhos com nome.

    Mar

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  7. Olá minha Lusitana generosa:)

    Seres gregários que somos. Eu sei que o sou. E que só pessoas muito especiais é que conseguem não o ser. Ou, por outro lado, os que não o são pelos piores motivos. Que são aqueles que fazem mal ao mundo. Esses não interessam nada. E há os místicos. Os que o são mesmo. Pessoas em que o silêncio é um exercício a prolongar filosofias interiores a que sei que não consigo aceder. Pelas limitações todas que tenho. E por gostar irremediavelmente de pessoas. De procurar as pessoas e o que há de bom em cada uma que coincidir comigo. Nos suportes que forem possíveis. Como este. Que me lembra repetidamente que o afecto, a amizade, o amor são coisas da ordem da graça. Acontecem. Depois, dizer que gostamos muito que nos tenham acontecido. Como a Lusitana. Que diz coisas lindas que me lembram coisas lindas. Obrigada. Muito. E com carinho.

    Da Mar. Que gosta muito de pessoas como a Lusitana:)

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  8. Olá minha linda:

    Seria estranho não coincidirmos também nestas coisas. De ir. De voltar. Viajamos de maneiras muito próximas. Estava escrito que iríamos ser amigas:)
    Os figos. A fruta que é voluptuosa. Que me sabe a Verão em pleno no Algarve. E a fim, aqui. Quando chego. Este ano, a Dª Maria José antecipou-se e acolheu-me assim. Com um doce de figos. Que soube bem. E o início de semana que já é de Outono foi muito lindo. Depois conto:)

    Um beijo.

    Mar.

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