Os sítios.








Lagos é uma cidade com alma. Pede para a percorrermos, para a andarmos. Para mim, essas deambulações começam cedo. Não há despertador nem nada. O sol nasce, começo a ouvir as gaivotas e o despertar é natural. Aquela pressa boa, que sinto. Como se estivesse a acordar para um grande acontecimento. É que a cidade é ainda mais bonita assim: de manhã. E eu gosto tanto dos meus rituais, dos meus caminhos. Começam sempre no Mercado da Avenida. Na banca dos peixes da Dª Dulce. A seguir, nos legumes e nas frutas da Dª Deolinda. Depois, no lugar mais exótico do mercado. As especiarias e os sais do Sr. José. Os meus afectos. As pessoas que me conhecem há anos. Que sabem do meu encantamento e a quem não preciso de explicar nada, porque já sabem e pronto. Sabem que a minha felicidade de férias passa pela comida de todos os dias. E é sempre tácito, o ritual no mercado. A Dª Dulce fica com os peixes enquanto sigo para a Dª Deolinda e a Dª Deolinda guarda-me o cesto, enquanto vou ver de mel e de ervas secas e de temperos mágicos no Sr. José. Depois, é a cidade. Este ano ainda a caminhei mais. Logo a seguir a escolher a comida, ia escolher os vinhos. Uma boa, isto de haver uma loja de vinhos tão perto do mercado. Faz parte dos meus caminhos, a Sommelier. Tal como a Casa Trindade, um dos endereços preciosos de Lagos. Como eu adoro casas de utilidades domésticas. Esta em particular, caótica e desarrumada, como devem ser estes lugares. E fui ao Mercado da Reforma Agrária. Gostei muito de passar uma parte do sábado neste sítio. Mesmo muito, que parecia uma criança feliz, com flores de muitas cores nos braços. Este mercado acontece só aos sábados de manhã e é mesmo imperdível. Flores frescas, doces de toda a espécie, ervas, legumes, frutos, cestos, animais, cerâmicas das olarias ali de perto, mel, compotas, pão. Mesmo especial, mesmo a pedir para ser partilhado. Fica aqui um bocadinho, então. E que faça bem a mais gente. 
E há mais dois sítios. Eu não sei bem se tenho religião ou não. Sei que gosto de igrejas vazias. Sei que as procuro sempre, nos lugares por onde ando. Não sei bem porquê, mas o silêncio de uma igreja vazia das palavras dos homens é diferente. Seja o que for, eu gosto de ir a esta igreja branca, em Lagos. É a Igreja de Santa Maria e é muito linda e muito simples e eu gostei de estar lá em silêncio. 
Do domínio do sagrado, é este lugar onde regresso todos os anos, bem perto de Lagos. O Vila Lisa. A comida do Vila Lisa, os bancos de madeira, as toalhas de papel onde se escreve o que for dito e que seja mesmo de guardar. Como esta frase do meu filho. Ele disse-a e eu achei que era mesmo de escrever e de guardar aqui, antes que deitassem fora a toalha de papel. E está. Fica aqui. 

E Lykke Li também. 


8 comentários:

  1. Os teus sítios, nas tuas férias são sempre lugares que eu também espero, já quase em setembro, aqui, no teu blog. Porque quase nunca nos vemos antes e porque nos dias que correm, aqui, é sempre mais rápido encontrarmo-nos.
    As fotografias lindas e os textos, e ver-te ainda com as flores no braço. E eu imagino bem a tua alegria por esses teus caminhos em Lagos, bem cedo, com a luz clara. E sei bem que isso te faz mais feliz.
    Roubo te então um pedaço destas coisas boas.Até breve !
    Um beijo abraçado,
    Já de regresso também das minhas.
    da Pipinha

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    1. Também sinto a falta de estarmos. As férias acabam por ser um paradoxo. Estas muito especialmente, com esta agitação toda cheia de renovação. Mas ficou tudo bem e tens de vir ver, que acho que vais gostar. Eu ligo para combinarmos, que ainda por cima está quase no teu aniversário:) E tu sabes como é, eu em Lagos. Conheces-me antes deste registo. Sabes da minha felicidade por existir ali e por ser Verão. Gosto muito que uma parte dessa felicidade fique contigo. Até breve, linda!

      Um beijo com um abraço.

      Mar

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  2. Estes teus textos sobre Lagos deixam-me sempre a sorrir. Transmitem uma alegria que passa para o lado de cá. A primeira foto ilustra muito bem aquilo que descreves. Linda, cheia de cor e de felicidade. Não resisto a um braçado de flores. Ainda ontem saí da escola, passei no senhor Moisés e comprei rosas e gerberas amarelas para enfeitar a sala :)
    Uma ternura, a frase do António. Daquelas frases que nos enchem o coração dos pais.

    Um beijo,

    Ilídia

    PS: Partilho isso das igrejas vazias. Uma paz que não se consegue em muitos lugares.

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    1. Bem feliz por esse sorriso, Ilídia. A verdade é que receio nunca encontrar o registo certo. Quero que seja fiel à integridade daquele lugar. À minha alegria por viver estes dias. É isso. E uma parte destas flores veio comigo. As de papel, que não precisam de água. Trouxe-as comigo, pouco antes de vir embora. O António, com todas as suas rebeldias, é de uma ternura enorme. Creio que os pais sentem sempre essas coisas, em relação aos filhos.
      Flores frescas e igrejas vazias, então.

      Um beijo.

      Mar

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  3. Fica aqui o teu roteiro saboroso dos dias de Lagos ;) Gostei que tivesses dado nome a quem te ajuda a tornar os dias mais felizes. E imaginei-te por lá, a saltitar por esses pontos de passagem que imagino deliciosos. Os sítios e as pessoas ficam aqui, mais o sítio silencioso de que falas. É bom. Obrigada ;)
    Babette
    PS. Liguei-te depois do jantar ;) Amanhã tento de novo!

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    1. Não estávamos. Fomos fazer uma das nossas caminhadas nocturnas, que durante o dia está muito calor. Eu ligo amanhã, que vamos sair para outros lugares e não vamos estar. Desta vez, sem mármores espalhados pelos terraços e assim:) A minha casa está finalmente pacificada. E eu também.
      As minhas pessoas de lá têm estes nomes. Não há sites que possa deixar. Mas bastam os nomes. O mercado é uma grande família. Pergunta-se e dizem logo onde estão as pessoas. Um roteiro com coisas de comer e de beber. Mais um sítio silencioso onde estar a sós. Ias adorar o mercado da Reforma Agrária, apesar da agitação toda que é.
      De nada:)

      Um beijo.

      Mar

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  4. Mar,

    É sobre Lagos não resisto a comentar :-)
    Nós, pessoas, somos de facto mundos... pequenos mundos que se vão descobrindo ou não. E essas descobertas existem muito (ou quase sempre) por causa dos outros.
    Vou contar-lhe um segredo: como já lhe disse, vou para a Meia Praia e Lagos desde que nasci, e à excepção do Mercado (onde fui uma vez), não conheço nenhum desses lugares que aqui trouxe... não é incrível?...
    Concluo, depois de ler o seu texto, que essa terra e essa praia têm sido lugares quase 'internos' para mim... É isso. Uma espécie de concha, não sei.
    Muito bom e encantador ler o que escreveu. Quando lá voltar espero encontrar esses lugares, tentar fazer caminhos diferentes.
    Obrigada.

    Beijinhos,

    Jo

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    1. Pode comentar à vontade:) Isso é curioso. Em todo o caso, tenho a certeza de que a Jo conhece lugares que eu não conheço e que nem sequer adivinho. E eu acho que percebo isso dos lugares que são conchas. Na verdade, nunca me apetece sair de Lagos e ir para outros lugares. Admito a distância até à Mexilhoeira Grande, em nome do Vila Lisa. Uma espécie de peregrinação. Tudo o mais, não me apetece porque implica perder horas numa cidade que é tudo o que eu preciso, no Verão.
      E se sim, se quiser, ficam estes caminhos. A minha intuição diz-me que iria gostar de os percorrer. Eu acho que sim. Obrigada pelo encanto. Fico feliz.

      Beijos para si.

      Mar

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