No dia do vestido que só se usa uma vez.

Todos os anos, neste dia, liberto o vestido que só se usa uma vez. De uma caixa, surge o vestido branco. Gosto de o vestir. Uma daquelas coisas que fazemos sem sabermos realmente porquê. Ou talvez não. Talvez saiba exactamente porquê. Para tentar recuperar aquele dia. Para o tornar visível outra vez. A igreja que cheirava a frésias e a flores de laranjeira. As pessoas. Os sorrisos. As palavras. As meninas encantadas com o vestido branco. A voz da minha mãe a cantar um salmo numa igreja de pedra. E o perfume dele. Sei que reconheceria o perfume dele em qualquer parte. Coisas que são este dia, há uns anos atrás.
Houve sol para aquele dia. E chuva. Ao final da tarde, chuva. Por essa altura, estava descalça. Já não havia véu. Nem cabelos disciplinados. Era eu com os cabelos soltos. Descalça. Num vestido branco escolhido meses antes. A noiva mais rápida, disseram as senhoras que estavam. Não houve provas intermináveis. Nem indecisões ou decisões de última hora. Sabia que o meu vestido devia deixar ver os ombros. Que não devia ser intangível, irreal ou demasiado mágico. Que devia ser assim como eu. E que devia permitir que eu pudesse soltar os cabelos e andar descalça.
Como todos os anos, libertei-o. Vesti-o. E olhei-o ao espelho. Para ver bem o dia de hoje. Há oito anos atrás. Queria olhar bem para trás. Muito lentamente. Para saber que quero continuar a olhar para a frente. Sem usar palavras definitivas. O para sempre. Não existe isso. Nem mesmo nos contos de fadas. Olhar para a frente sem palavras definitivas, então.

16 comentários:

  1. A Borboleta Branca no seu mágico vestido branco...
    Congratulations to the lovely couple!
    8x8 more...♥♥

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  2. Olá, Mar
    Imagine que hoje quase que perguntei a uma senhora que vi no Corte Inglés se era a Mar. Só não o fiz porque pensei que eu não estava vestida de uma forma adequada para a conhecer. Coisas de mulheres! Felizmente não fiz a pergunta, porque não seria a Mar.
    Muitos parabéns.
    bjs

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  3. Que engraçado, essa ideia de vestires o "vestido que só se usa uma vez", ano após ano, no mesmo dia. Aqueles rituais que todos temos, e que nos "quotidinizam" a vida e os gestos. Queres outra sintonia?... Também os meus ombros se deixavam ver nesse dia!
    Desejo-te (vos) as maiores felicidades nos próximos anos. Que queiram olhar para a frente muitas e muitas vezes, porque o caminho é longo!
    Um beijo
    Babette
    PS. Ri-me imenso com o comentário da Fa! Coisas de mulheres, absolutamente deliciosas! um beijo para si também, (aqui a) querida "Fa(da)"

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  4. Boa noite Mar!
    Já que estamos numa de mulheres...Que bom que passados oito anos...ainda vista o vestido do grande dia!...(Eu já não visto o meu!...mas já conto vinte e sete!)
    Oxalá que o caminho seja sempre para a frente! O facto de reconhecer que nada é definitivo é um bom alicerce para uma construção de sucesso;
    a felicidade conquista-se!
    Parabéns aos dois!
    Um beijo com muita ternura.
    Emília Melo

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  5. Um dia muito feliz, o dia há oito anos!
    Eu com um vestido meio oriental, mas curto. Estava em voga o estilo, na zara :)Tu muito linda, no teu vestido de princesa!

    Um abraço,
    da Pipinha !

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  6. Quase isso, que sentimos quando usamos um vestido branco. Como os das princesas. Uma borboleta branca, então. Dizes tu e o meu pequenino.

    Um beijo de obrigada, minha happy single mother:)

    Mar

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  7. Uma situação curiosa, minha querida Fa. E engraçada, também. Dizem que todos temos um sósia algures, não é? Muito provavelmente, a minha sósia andará por Lisboa e vai às compras ao El Corte Inglès:)
    E essas coisas de mulheres:)Fique a saber que adoraria conhecê-la. Estivesse como estivesse. Uma coisa que há-de acontecer. Temos isso agendado há demasiado tempo. Um dia vou a Lisboa, então. Para conhecer a Fa. Sem que seja preciso uma roupa adequada:)

    Um beijo cheio de carinho para si.

    Mar

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  8. Olá minha Babette:

    Um daqueles meus rituais, este. Mas faz-me bem olhar o meu vestido. Tão simples que é.
    Engraçada mais essa coincidência. A dos nossos dois vestidos serem sem ombros:)
    Obrigada pela felicidade que enviaste. A ver se sim, se a conservamos. À felicidade mais importante: a de todos os dias.
    Lindo, o comentário da Fa:) Também me fez sorrir. Coisas nossas, mesmo.
    Um beijo.

    Da Mar

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  9. Olá Emília:

    Uma marca impressionante. Vinte e sete anos. E sim, preciso muito da lucidez de achar que pode não correr bem. Pode não ser como foi projectado. Partilho isso com o meu marido, essa lucidez. E acaba por ser esse o verdadeiro alicerce, creio. Gosto da humildade que pressupõe. Sem grandes declarações de intenção. Sem coisas definitivas que depois acabam.

    Um beijo carinhoso. Porque esteve aqui no dia do vestido branco.

    Mar

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  10. Mesmo feliz, o dia de há oito anos! Estávamos tão leves. Nós e os nossos vestidos. Eu acho que andava mesmo como as borboletas:) A pairar de um lado para o outro. Parecias uma japonesa, no teu vestidinho curto:) E agora também tu tiveste um vestido de princesa. Usado no mês frio de Dezembro.

    Beijinhos para a Pipinha!

    Mar

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  11. Olá Mar!
    Hoje foi impossivel passar por aqui e não comentar, tambem esse é um dos meus rituais, desde á 11 anos (12 em Julho). Em todo este tempo só não o pratiquei em 3 anos consecutivos (era fisicamente impossivel :)), mas retirei-o da caixa e fiquei a matar saudades. Encontra-se exatamente como o despi,está um pouco sujo como é natural, mas não o consegui mandar limpar, não sei explicar, mas para mim só faz sentido assim, era como se fosse apagar todas as sensações que vivi naquele dia. Mesmo que a vida tome outro rumo, esse será sempre um dia a recordar com muita saudade, um dos dias mais felizes da minha vida.
    Obrigado pela partilha e espero que continuem a construir a vossa felicidade. Um beijo.
    Sónia Lopes

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  12. Eu não podia deixar de lhe dar um beijinho especial neste dia! Gostei da maneira como a Mar descreveu a sua cerimónia. Gostei ainda mais da parte em que, descalça, passou a correr com o cabelo já livre! Muito poético, a antever a forma de uma relação que se quer duradoira! Um dia feliz e conte sempre com a minha admiração!

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  13. Olá Mar! Gostei muto de ler o teu ritual! Eu, curiosamente, nunc amais vesti o meu.....mas fiquei com vontade. Muita. Um beijinho e muitas felicidades!

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  14. Olá Sónia:

    Que bom ter sido impossível não dizer nada:)E melhor ainda coincidirmos nesse gesto de voltarmos a usar os nossos vestidos de princesa. Mesmo que os anos passem. Mesmo que em algumas circunstâncias, os nossos corpos não tenham permitido que isso acontecesse. Coisas de mulheres, também.
    Compreendo isso de não ter mandado limpar o seu vestido. O meu teve mesmo que ser. Era imperativo, porque andei descalça a dançar, a arrastá-lo pelo chão:) Não dava mesmo para guardar como estava.
    Obrigada por ter partilhado o seu casamento. As memórias do seu dia, a propósito do meu dia de há oito anos atrás. Mais uma coisa boa a juntar às outras todas.

    Um beijo com carinho. E muita felicidade também. Para a noiva do vestido que nunca chegou a ir para a lavandaria:)

    Mar

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  15. Olá minha Lusitana:)

    Sabe que se este dia fosse mesmo hoje, o seu rosto estaria lá. Faria parte das memórias que guardo de olhos fechados. Como as que tentei escrever. As coisas que foram aquele dia. Parte delas, pelo menos.
    Obrigada por se associar aos oito anos do meu casamento. A ver se sim, se é para durar, a felicidade. Sempre a ver se sim, que estamos.

    Um beijo com muita admiração. E carinho. E todas aquelas coisas boas que vamos significando:)

    Mar

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  16. Olá Filipa:

    Sim. O mais possível. Usa o teu vestido de noiva. É muito lindo revermo-nos nos nossos vestidos. Sabendo que não conseguimos recuperar inteiramente aquele momento em que nos olhámos ao espelho. O momento antes.

    um beijo para ti também. Já disse que gosto muito do teu blog:) E dos teus textos?

    Mar

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