Flora.

























Cada bocadinho de verde que se semeia é uma afirmação humilde e solene de esperança. Não tem só que ver com as leituras simbólicas associadas ao verde enquanto cor. Não é só isso. Tem que ver com o gesto de semear, de plantar, de cuidar. E também isso significa coisas. Muitas coisas. Tenho por hábito plantar qualquer coisa por cada coisa má que me acontece. Tudo tem ângulos e perspectivas. E, à partida, parece um gesto que prolonga o mal ou que o lembra reiteradamente. Eu acho que não. Penso sempre que tomar conta de uma planta pequenina e vê-la crescer, é uma maneira de olhar o mal de frente, na sua fealdade de monstro e devolver-lhe a beleza muito frágil de uma planta. O mal só vence quando nos amarga. Só aí. E aquilo de fazer acontecer algo de bom, a partir de algo mau. 
São muitos os pontos verdes dos quais cuido como se isso fosse uma espécie de religião. Sei o que cada um significa de perda, de desilusão, de mágoa. Mas isso é biográfico. No que dependeu e não dependeu de mim. E é tão bonito perceber quotidianamente que o momento mais árido se transforma em verde exuberante, que o importante é não deixar morrer o que em nós espera e persevera. E tomar conta. Sendo que cuidar seja do que for é, antes de tudo o mais, uma forma de tomarmos conta de nós. E determo-nos na beleza que vive nas coisas ínfimas. Cuidarmos da casa que somos, no que isso tem de interior e de exterior. Renovar, olhar para as coisas de sempre, à luz do que somos agora e não do que fomos antes. Saber que uma parede branca é sempre uma espécie de poema à espera de ser escrito. E a Primavera persistente de umas andorinhas e essa ser a primeira coisa que vejo, mal acordo. E uma faiança portuguesa do século XVIII junto da arte da Margarida Fleming. Mais a urze que apanhei na serra, a fazer sentido junto de uma taça tibetana. E os cinzas e os brancos. E os livros. Tantos, que tudo é determinado por eles e pelos lugares que são, na casa.   
Pelo meio de tudo, a minha comida. E a alegria que ela sempre significa. Como estes panini. Perco a conta a essas alegrias. Aos lanches da minha família numerosa e ruidosa que, numa vida anterior, andou pela Itália ou pela Grécia:) A meio de sessões de cinema pela noite dentro e eles serem a hipótese pedida de imediato. Aos almoços improvisados, sem talheres e sem lugares marcados. Aos regressos tardios a casa, depois de viagens. É sempre a comida que está na lembrança. E faz-se como se nada fosse. Comida honesta é assim mesmo. Nutre, alimenta, dá colo. E é sempre um abrigo, um lugar seguro onde chegar. Com a flora profusa que fica hoje, esta receita simples e que é uma espécie de garantia de alegria, quando se dá de presente. Assim simples. E este livro breve, que lembra tanto de essencial. Caminhar não é só ir de um ponto ao outro, nem é só ergonomia. Deixo esta matéria sobre o homem que escreveu este livro, a propósito de um outro que já li e de que já deixei referência aqui. Mais as páginas da revista onde reconheço há tantos anos a minha herança mediterrânica. Nenhuma página é em falso. A poesia das casas do sul. E haver nisso um Verão que não acaba nunca. 

A receita nem é bem uma receita. São antes os passos, até chegarmos àquele ponto delicioso de queijo derretido entre duas fatias de pão estaladiço:) 

Panini de queijo gouda, bacon e tomate com azeite de orégãos e manjericão
Quantidade para três panini 

1 baguete + 6 fatias de queijo Gouda + 6 lascas de bacon + 1 tomate maduro (cortado em fatias finas) + azeite + orégãos + manjericão. 

Corta-se a baguete em três pedaços iguais. Abre-se ao meio, divide-se ao meio duas fatias de queijo, coloca-se em cada um dos lados do pão, consoante uma das imagens e reserva-se. Na prensa onde serão aquecidos os panini, coloca-se as fatias de bacon e tosta-se um minuto de cada lado. Quando estiverem prontas, põe-se uma fatia de bacon em cada lado do pão. A seguir, o tomate. E uns salpicos de orégãos e de manjericão. Fecha-se as fatias e leva-se à prensa. Deixa-se estar durante uns dois minutos ou vamos vendo consoante o derreter do queijo e as marcas no pão. Pouco antes de retirar, pincela-se com um pouco de azeite, misturado com as ervas. Uns segundos de prensa, a alegria daquela efervescência do azeite com o quente do pão e está. Depois, basta o que nos apetecer no momento: uma limonada bem fresca ou um copo de vinho branco ou o que for. 

A música é dos Wolf Alice. À espera do concerto no dia 1. Space and time. 


4 comentários:

  1. Tão lindo, tão bom, acompanhado de palavras sábias: * O mal só vence quando nos amarga.* Plenamente de acordo!

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    1. E todas as pessoas de bem devem lembrar-se (muito) dessas palavras. Obrigada pelas suas palavras, Ana. Muito.

      Mar

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  2. Sempre sempre uma leitura, que me faz pensar, olhar para dentro, ler o nosso interior.
    Grata pela mensagem do bem.

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    1. Mais importante do que todas as leituras exteriores, esse olhar para dentro. Necessário, fundamental, difícil. Mas infinitamente renovador.

      Obrigada eu, Lina.

      Mar

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