Terminal 4450 | Porto de Leixões.


























No perímetro de Leça | Matosinhos, o expectável ou o habitual é procurar/ir a sítios onde a matriz seja o mar, o que vem do mar. Até que é. E faz sentido que assim seja. Que haja ali uma concentração de lugares dedicados a interpretar ou a dar palco aos peixes maravilhosos das águas atlânticas e frias. Por algum motivo um dos sítios onde reiteradamente gosto (muito) de ir, seja neste perímetro. Este de que já falei aqui. Por isso, quando vou a outro lugar nesta zona, sou ainda mais criteriosa. O ponto é muito simples: é bom que valha a pena, para me fazer abdicar da comida despretensiosa e honesta do Tito II.
E então, num destes dias, em vez de seguir o caminho habitual e de parar em frente à Docapesca, andei mais um bocadinho e fui dar ao Terminal 4450. E é curioso pensar-se no significado das palavras. Terminal soa a fim, a extremo, a limite. Essas ressonâncias são objectivas e estão certas. Mas os extremos são lugares em que as fronteiras estranhamente se dissipam. Muitos e muitos finais das nossas vidas pressupõem inícios. E, em léxico de viagem, terminal significa mais início do que fim. O início de uma (nova) cartografia, enquanto procuramos o nosso terminal.
O Terminal 4450 procura simular essa experiência. Vamos seguindo um percurso que nos dá a ilusão de estarmos a caminho de voar. A estética de aeroporto num porto. E o paradoxo (aparente) desse jogo. A juntar ao outro paradoxo, que é ser um sítio perto da água onde se vai para se comer carne. E sim, muito bom. Se não fosse, não escreveria sobre este lugar. Faria o que às vezes tenho de fazer, quando vou a sítios que não, que é apagar as fotografias e não querer a memória. Nem em mim, no que é possível apagar. Nem aqui. O (meu) critério é sempre esse: gostar.
Por isso, o Terminal 4450 transformou-se em mais um endereço a registar. Pela comida, em primeiro lugar, que só consigo achar piada à estética quando o mais importante está em cima da mesa. Pela carne. Muito por isso. Suculenta, generosa, bem no ponto. Pelas asinhas de frango que o meu filho disse que eram melhores do que as que faço e pelo sorriso que esse comentário paralelo desencadeou no rapaz simpático e atento que estava encarregue da nossa mesa. Pela alegria dele, ao deixar de parte os talheres, porque há coisas que são melhores assim: a sujar as mãos. Pela bola de Berlim que é uma sobremesa de encher as medidas. Neste particular, convém dizer que não vale a pena estar a pedir outro doce, por este ser do género de partilhar. E para este sítio, é melhor não vir com espírito de dieta ou de contar calorias. Se assim for, mais vale não seguir viagem. O ponto é que seria bem triste não fazer esta viagem. Creio que é por aí.  
Mal recebemos um passaporte-ementa, sabemos que se trata de uma espécie de percurso. Com esse passaporte, vêm para a mesa as famosas pipocas salgadas do Terminal 4450, um saco de papel com pão dentro, manteiga com cenas e um frasco com azeitonas. Depois, uma versão desconstruída de bola de carne com rosbife que entretanto foi pedida para entrada. Assim que se escolhe a carne, escolhe-se também os acompanhamentos. Escolhi os mais essenciais, por achar que são os detalhes tidos como simples que nos permitem perceber/descodificar um sítio. Esparregado, coleslaw e batatas fritas. Estava tudo bem, excepto a parte das batatas fritas. Uma mania que agora há nos sítios de cortar as batatas em pedaços demasiado grandes. Não ficam estaladiças, naquele espírito bom que nos reconcilia sempre com a criança que trazemos dentro. E não há molho new age ou erva aromática que salve. Batatas fritas são/devem ser batatas fritas. E a pessoa que inventou as batatas fritas devia ser uma pessoa mesmo boa onda, de bem com a vida, porque foi/é das melhores invenções do universo:). 
Mais uma coisa a propósito deste sítio: fica no antigo terminal de passageiros do Porto de Leixões. Não é ficar perto ou nas imediações de. Fica no coração. Impossível não pensar nas metáforas todas, enquanto se olha os navios altos como edificações. Em todas as amarras, em todos os compartimentos estanques, em todos os desconhecidos, em todos os portos das nossas vidas. Os de chegada. Os de partida. Seguros. Mais ou menos seguros. Mas, mais do que os barcos e todas as suas metáforas, gosto da imagem serena de um farol. De como é uma edificação-símbolo. A omnisciência tranquila de um farol. E o mar, a luzes diferentes. O mar em Leça, ainda o céu era só azul. E, mais tarde, o mar na Foz. E aí, aquela coisa boa de sentirmos que, por momentos, viramos costas ao mundo e estamos a sós com aquele horizonte atlântico.  

A música é dos Massive Attack. O trip hop de Bristol de que hei-de gostar sempre. Desta música, muito especialmente. Angel. 


2 comentários:

  1. Olá Mar,
    Então esteve aqui, bem pertinho de mim! Da marginal, do porto de mar, das praias e do farol que já são um bocadinho meus. Não conheço ainda esse terminal tão especial, mas fica desde já como uma maravilhosa sugestão. Da minha janela, sempre que posso, sigo o movimento de entrada e de saída dos navios. Quando saem, gosto de acompanhar o seu movimento paralelo à linha do horizonte até mudarem a rota e desaparecerem. Há um contentor no porto de Leixões que tem uma inscrição do verso 'Todo o cais é uma saudade de pedra', da Ode Marítima. É um lugar especial, este. Um cais cheio de surpresas e de coisas boas. Volte sempre!
    Um beijinho,
    Marta

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    Respostas
    1. Olá Marta,

      Sim:) E a Marta tem imensa sorte por poder ver essa água e esse movimento dos navios. E o Álvaro de Campos tem/tinha razão: uma saudade de pedra em cada cais. Os poetas é que sabem tudo.
      Vou voltar, sim. Ao Terminal 4450. Aos outros lugares que aí (me) são especiais. E a ver se conhece este terminal perto de si, então:)

      Um beijinho*

      Mar

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