"Sempre chegamos ao sítio aonde nos esperam."


















O amor é uma equação com variáveis infinitas. Não há uma maneira certa de o escrever. Não há uma maneira certa de o dizer. Não há uma maneira certa de o viver. Mas o amor transforma todos os errados em certos. Todo o amor é abençoado. Todo o amor é benção. Todo o amor está certo. Mesmo que seja escrito em águas incertas e tempestuosas. A seu tempo, a água acalma e devolve a cada grão de areia a verdade das coisas. E isso é tão destino quanto o destino que fez com que duas pessoas chegassem uma à outra, sem saberem que se esperavam. O tal sítio onde esperamos e somos esperados, creio. O sítio inqualificável onde a espera termina e uma coisa sem nome começa. Quando duas pessoas (se) amam, voltarão sempre ao tal lugar onde esperaram e eram esperadas. E não é preciso mapa nenhum para saberem exactamente que lugar é esse, assim que sabem que existe e que é só delas.
A frase que é o título deste texto é de José Saramago. Guardei-a faz tempo. Não sabia que ela iria ser o fio das coisas que quero guardar aqui, a propósito da história de amor da Mariana e do João. O destino dessas palavras estava a respirar serenamente, à espera deles os dois.
A Mariana e o João casaram-se neste Verão a começar, num final de tarde como nos filmes e nos livros. Levaram o amor deles ao altar de uma igreja muito fresca e muito clara e a seguir, fomos todos juntos para o jardim da Mariana e fizemos uma festa pela noite dentro. Pela manhã, ela veio ao meu jardim. Ainda não estava vestida de branco-pérola. Os cabelos ainda estavam soltos. Mas era já uma noiva linda. Feliz e tranquila. Sem angústias nem nervos por causa de vestidos e de maquilhagens e de coisas da festa. Nada disso. Ainda nos rimos quando me contou que, pela manhã, as crianças e os adultos da família dela tinham andado em pânico, a tentar desligar a rega do jardim onde a festa ia acontecer:) Ela, na sua calma, disse que não percebia qual era o problema. Estava tanto calor, que as coisas molhadas pela rega iriam secar e estar bem para a festa. Iria estar tudo bem. E foi assim mesmo. Esteve tudo bem. Estava tudo no lugar certo por eles os dois estarem no lugar exacto onde deviam estar. Quando é assim, não importa o cenário. Porque o amor pode fazer com que um lugar cinzento se transforme no mais maravilhoso dos lugares. Nenhuma coordenada na vida da Mariana a ligava ao João. Nenhuma coordenada na vida do João o ligava à Mariana. Mas o tal sítio onde se encontrariam estava lá. À espera que eles fizessem o caminho. Quando nos abraçámos de manhã, ela disse-me que eu sabia o que era, como era. E sim. Sei. Também fiz esse caminho sem coordenadas prévias. 
Há muitos casamentos. E são muitas as razões que fazem com que as pessoas se casem. Nem todas são românticas e etéreas. Isso é só triste e é sem história. Mas o amor é outra coisa. É tão outra coisa que é aquilo que aqueles que se amam quiserem que seja. E isso passa também por não haver casamento nenhum. O amor basta-se. Abrigo que tudo perdoa, tudo espera, tudo dá. "E tantas vezes, até que se perca o sentido do teu e do meu", disse o padre Bartolomeu Lourenço no Memorial do Convento, ao abençoar o amor sobrenatural e de primeiro olhar de Blimunda e de Baltasar. Casou-os no mesmo momento em que os viu partilhar uma tigela de sopa. O amor é assim. Pode até encontrar-se numa tigela humilde de sopa, partilhada por duas almas e dois corpos que também não sabiam que iriam chegar ao sítio onde eram esperados. Mas chegaram. Tal como a Mariana e o João. Encontraram-se numa latitude só deles, ângulo perfeito onde descansam na verdade que só o amor. E eu estou tão feliz por isso. Desde o primeiro momento que estou feliz por isso. 
Com a benção deles, fragmentos desse dia. Os corações feitos pela mãe da Mariana, pendurados nas árvores. As hidrângeas espalhadas pelo jardim. As camas de rede nas árvores e os fardos de palha com mantas. A água do lago e do tanque de pedra. A benção da sombra das árvores. As lanternas e as velas. As crianças que pareciam pequenas fadas. A eira feita lugar para dançar. Tudo mágico. Tudo abençoado. Tudo amor e pequenas coisas maravilhosas. 

A música é a música deles. E foi a música que fez com que todos sentissem uma magia muito particular, no momento inqualificável em que tudo era fogo de artifício e amor e vidas a dizer que sim. 

Para a Mariana e para o João, que estão não sei onde:) Isto que fica é sobre eles, mas no fundo, é sobre todas as histórias de amor. Sobre todos os que chegaram aos sítios onde eram esperados. 



6 comentários:

  1. Respostas
    1. Tanto. O dia. A história deles. Todas as histórias de amor.

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  2. A frase de Saramago (que eu desconhecia), faz tanto sentido... Adorei as imagens tão, mas tão lindas! Pormenores simples, mas tão maravilhosos. As crianças, todo o verde, os pequenos corações, as flores, o vestido... Lindo, muito lindo.

    Dou conta, que há muito que não falo de amor. Isso deve querer dizer algo. O amor é feito de pequenas coisas. E de não dizer para depois. É feito de um alimentar constante. Deixo este texto, que gosto muito:


    '' Se amarem alguém, digam que amam.
    Partilhem o vosso conforto por saber que aquela vida e a vossa vida têm um lugar de encontro. Digam a vossa gratidão, o vosso contentamento, a festa que acontece dentro de vocês de todas as vezes que se lembram que aquela pessoa existe. E se for muito difícil dizer com palavras, digam de outras maneiras que também possam ser ouvidas.. Preparem surpresas, bordem delicadezas no tecido às vezes áspero das horas.. Reinaugurem gestos de companheirismo. mas, não deixem para depois. depois é um tempo sempre duvidoso.. depois é distante daqui. depois é sei lá... '' - Ana Jácomo


    Muitas felicidades para a Mariana e para o João ;)


    E um beijinho muito grande para ti, querida Mar ♥

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    1. Esta e outras frases de Saramago andam sempre comigo, gravadas na memória, escritas em papéis pequenos e breves. As palavras ajudam-nos a pensar (n)o mundo. O bom e o mau encontram sempre uma explicação possível.

      Não gosto assim muito da palavra "depois" :) Só quando percebo que algumas coisas não têm solução imediata é que gosto da lucidez do "depois". E sim, a liberdade de viver o amor sem estar a adiar nem a calcular. Se é amor, é viver e pronto.

      São felizes, eles. Estão muito felizes. E eu por eles.

      Obrigada pelo texto que deixaste. Muito lindo e cheio de coisas certas.

      Um beijo, linda Cláudia!

      Mar

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