Da cidade feita de luz e de água.






























Uma das minhas cidades. Eu sei que há outras. Umas onde estive. Outras onde falta estar. Muitas, estas últimas. Com mais ou menos arte. Com mais ou menos possibilidades de beleza. Com mais ou menos coisas a acontecer. Mas eu acho que o céu é diferente em Lisboa. Acho que a maneira como a luz está por todo o lado é diferente. Não deve ser assim nas outras cidades. Mesmo que a luz dessas cidades seja linda. Lá é mais. Para mim, é mais. É luz com água. Até pode acontecer andarmos em ruas de onde não se vê a água. Mas a luz faz com que cheguemos lá. A um lugar qualquer onde se possa ver a água. Ou adivinhar a luz líquida que não há nos outros sítios.
Quer ser sobre a luz de Lisboa, o texto de hoje. Mas também sobre lugares que ficaram. E o mais importante: fragmentos partilháveis do que foi sentido e pensado. Nos lugares que acolheram o que se pensa e sente. E então, um restaurante perto da água. O Bica do Sapato. Um lugar que para mim significava um tempo que me era anterior. Um lugar que o conhecia sem mim. Era importante levar-me a um lugar onde tinha existido sem mim. Aconteceu, então. E correu tudo bem. Com a comida. Com a maneira como se é acolhido. Com a sala das cadeiras diferentes umas das outras. E o silêncio ante a água lá fora. A ver a luz a cair na água que havia do outro lado do vidro. E saber que há coisas que permanecem. É do que me lembro mais. Das cadeiras diferentes da sala de jantar. Do rio. Dos minutos que aconteceram antes de a luz dizer até amanhã. E de mais coisas que são assim como a água e a luz. Silenciosas.
Depois, um edifício alto. Bem no núcleo. Um quarto no último andar de um hotel na Avenida da Liberdade. O Tivoli. Que é a memória de uma conversa que se prolongou até ao início do dia seguinte. Com chá e doces. Não me lembro assim de muitas coisas do Tivoli. Daquelas que são para escrever num blog deste género. Vou ter de voltar lá. Para poder dizer melhor aquele lugar. Só ficou mais um bocadinho de luz. Porque acordei cedo, a tempo de a ver acordar na cidade de que gosto muito. E sim, era um dia de sol. A futurologia possível, a dos hotéis: antecipar um dia de sol.
A música dos Little Dragon faz-me regressar à cidade da luz mais bonita. E anda comigo de carro todos os dias:) Hoje fica aqui. Para fazer parte, também.

9 comentários:

  1. Olá, Mar. Este seu post faz-me pensar mais uma vez nas limitações de quem vive rodeado de mar. Para nós, uma ida a Lisboa não pode ser uma coisa de fim de semana. Tem de ser algo planeado com alguma antecedência. No meu caso, só nas férias ou interrupções letivas.
    Ao ler o seu texto, lembrei-me dos quadros da Maluda, com toda aquela luz :)
    Concordo consigo. Lisboa é uma cidade linda. Aliás, temos cidades muito bonitas em Portugal. Também gosto muito do Porto. E de Aveiro. E da Praia da Vitória :) Um beijo.

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  2. Sabes que vou gostando mais de Lisboa, pelos teus olhos? É indiscutível a luz. E é verdade que é "menina e moça". Sinto sempre isso. Talvez pelas cores da cidade, especialmente o rosa. Por contraponto, o Porto é solene, ou simplesmente tem "outra altivez", como diz a canção...
    Um beijo de fim de Verão.
    Babette

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  3. Lisboa. Desde sempre que gosto da cidade grande, mesmo quando iamos com os pais, numa viagem imensa, primeiro de automotota e depois num comboio mais rápido. Na noção de velocidade do antigamente. Mas chegávamos e tinhamos a luz de que falas, os edificios claros, as ruas tão compridas que chegavam ao rio. E depois o cuidado de andarmos sempre pela mão do pai, o que aqui não era preciso.
    Hoje continua a ser bom Lisboa, a luz a mesma, mas pela mão de quem já lá morou, antes de mim. E então há almoços na Gulbenkian, junto ao jardim, e lanches rápidos na Frutalmeidas, com sumos de laranja e pasteis de massa tenra, e cinema King, e Baixa. E depois, sempre o regresso.
    Bom ter escrito a minha Lisboa com Litle Dragon. Nem conhecia o grupo, só a musica. Merci.

    Beijinhos,
    Da Pipinha

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  4. Olá Ilídia:

    Uma cidade de que hei-de gostar sempre. Com a luz de que gosto tanto. E todos os lugares onde sinto sempre uma ideia muito especial de casa. Como se fosse uma casa, a cidade com a luz mais bonita. Perco-me lá desde há muito. E encontro-me sempre. A minha mãe conta muitas vezes um episódio de quando era pequena. De como comecei a andar sozinha e foram encontrar-me no jardim de uma casa, a fazer festinhas a um cão com um ar pouco simpático:) A primeira de muitas vezes em que me perdi em Lisboa. Para voltar a encontrar-me.
    Concordo. Aveiro. Porto. E gosto de imaginar como será a sua Praia da Vitória. Verde e rodeada de água.

    Um beijo para a ilha da Ilídia. E para a Ilídia:)

    Mar

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  5. Se o Porto fosse gente, seria uma pessoa reservada. No início. E franca, depois. É uma das visões da tua/nossa cidade. Lisboa é uma mulher que é sempre bonita e luminosa. Mesmo quando está mais melancólica. Mesmo quando está a acordar. Fico feliz por gostares mais um bocadinho da cidade que é muitas coisas para mim.

    Um beijo de Outono. No primeiro dia de Outono.

    Mar

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  6. Engraçado falares no cuidado de andarmos sempre pela mão:) A primeira memória que tenho de Lisboa é exactamente a de soltar a mão. E de ganhar distância da minha mãe e das minhas tias. Com passos pequeninos de seis anos. Depois um jardim muito bonito. E um cão. No fim, o ar aterrado da minha mãe e das minhas tias:)
    Agora conheces a cidade pelo olhar do teu Pedro. Pelos olhos do amor, as cidades são sempre mais bonitas.
    E ainda não fui à vossa Frutalmeidas:) A ver se sim, num futuro próximo.
    A música dos Little Dragon faz-me bem. Há uma outra versão desta música que é igualmente linda. Um bocadinho mais lenta. Mas com a mesma cadência de que se gosta. Que bom teres dito um bocadinho de Lisboa com a música que ando a ouvir nos últimos dias. E que faz com que trezentos quilómetros sejam nada.

    Um beijo.

    Mar

    PS: Trocaste um "r" por um "t":) Acontece. Já me aconteceu, também. Lapsos.

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  7. A criança em mim sempre viu Lisboa como a cidade imensa das avenidas, dos prédios altos, do barulho constante proveniente do trânsito infernal, dos semáforos, de pessoas apressadas dentro e fora das passadeiras, repletas de ares duvidosos, dos labiríntos que para mim eram as estações de metro...Só a mão que eu agarrava me dava conforto, como se fosse um fio ténue que separava a segurança da insegurança.
    Hoje, Lisboa é um desafio, uma descoberta constante, é o misto de querer voltar a lugares conhecidos e o desejar ser surpreendida por outros lugares dentro do lugar.

    Um beijo
    Patrícia

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  8. Olá Patrícia:

    O nosso olhar enquanto crianças faz com que as coisas tenham dimensões desconhecidas. Ou melhor, com que tenhamos a sensação de ver tudo sempre pela primeira vez. Lisboa tem esse efeito. Devolve-nos um bocadinho daquele olhar inicial. Como a sua formulação muito bonita. Lugares dentro de um lugar.

    Um beijo para si.

    Mar

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