Barcelona aleatória.



















Barcelona era uma cidade que estava na minha memória de raspão. Tinha sido só um sítio onde tinha estado entre sítios. Não como destino. Tinha ideia do efeito de estufa do Mediterrâneo. De haver gente por todo o lado. De querer ir embora o mais rapidamente possível. Era assim. Barcelona era só assim, na minha memória. E isso era uma lástima. Por isso, desta vez, foi uma cidade-destino. E ainda bem que assim foi.
Neste primeiro post, o registo é aleatório. Muito cheio das janelas, das varandas, das ruas. Dos detalhes, no fundo. Algumas das pequenas coisas que vão connosco de viagem, que andam connosco a caminhar os sítios todos. As Josefinas nos meus pés, naquele compromisso bom entre a elegância e o conforto. Tão útil em viagem, esse compromisso. As minhas bagagens são frugais. No Verão, ainda mais. Roupas leves, tecidos que não amarrotam, um vestido preto e curto que tanto dê para entrar num mercado como para ir à ópera. E nos pés, a leveza das Havainas, intercalada com a leveza poética tão Alice no País das Maravilhas. Os tais detalhes, creio. Assim como as equações de vestir, na t-shirt do meu filho e que também será sempre uma das memórias tangíveis dos dias quentes de há dias. E a Teoria do Big Bang. Onde quer que estejamos, o Sheldon Cooper parece acontecer também:) 
Tal como em todas as viagens, faço uma espécie de passeio virtual prévio. Isolo algumas coisas e deixo uma margem larga para o inesperado. Mas faço planos. Nestas coisas, não confio inteiramente na ideia de deixar ir. Até porque o princípio desses planos é o mesmo da minha vida quotidiana. Para dar mais densidade a este ponto: os meus planos poupam-me a maçadas, a maior parte das vezes. No caso das viagens, muito. Os bilhetes para os museus são comprados antes, o check-in é feito antes, os sacos de viagem são pragmaticamente leves. Coisas assim. Que libertam tempo. Que fazem com que seja mais fácil concentrarmo-nos na poesia toda dos lugares que queremos ter em nós. Por isso, não me importo minimamente de tirar uns minutos para antecipar alguns detalhes, se isso significa não ter de estar em filas, à espera de entrar num lugar qualquer ou num avião. 
Barcelona é de amar. É tão de amar. As próximas páginas serão dedicadas aos sítios de uma cidade que é uma homenagem ao Mediterrâneo, à alma mediterrânica. Para mim, as viagens não pressupõem esquecimento, não são circunstâncias herméticas, nem de fuga à realidade. É ao contrário, reforçam a noção de memória, de património. Individual e colectivo. Por isso, os meus dias em Barcelona foram dias atentos à Grécia. Aquela geografia gerou a mundividência que habitamos. E isso inclui também as elites que tomam decisões. Aquela geografia é imprevisível. E isso não é economia. Isso é História. Basta ter umas noções ligeiras da cronologia anterior, para perceber que aquele Mediterrâneo não é só águas cálidas para férias de Verão. De vez em quando, aquele Mediterrâneo causa estragos. E eu creio que as tais elites não estão à altura do momento histórico que estamos a viver. Ocorreu-me isso muitas vezes, enquanto me encantava com Barcelona. 
A luz, a temperatura, as janelas abertas, a ligeireza catalã, a arte, a água e a alma da comida. Tanto, dessa alma que se come. Barcelona é tão bonita e tão intensa e tão difícil de dizer. Melhor não dizer mais nada até ao próximo texto. 

A música é dos The Libertines. Don't look back into the sun. 


6 comentários:

  1. Olá Isa,
    Sabia que ias gostar ! Tão de mar, tão de casas abertas, ruas grandes e árvores altas com boas sombras, comida boa, gente simpática.
    Que bom teres trazido Barcelona contigo. Fico a aguardar por mais !
    Um beijo grande !

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Muito. Gostei muito. Está sim. Barcelona está aqui comigo. Daquela maneira que tu sabes. Conheces-me bem.
      Isso tudo que escreveste. E sim, a comida. Eu até tinha antecipado essa parte, mas a vida é uma caixinha maravilhosa.
      Ligo-te amanhã, que temos uns assuntos a tratar:)

      Um beijo grande para ti!

      Mar

      Eliminar
  2. Mar haveria algo de muito errado se não gostasses de Barcelona, ainda bem que lhe deste uma oportunidade. ;)
    Adoro e de vez em quando dá-me umas ganas de ir a barcelona muito idênticas ao desejo de comer mousse de chocolate. The Libertines está muito bem, mas esta também enquadraria bem o cenário: https://www.youtube.com/watch?v=Xho-nrHVeMQ

    beijinho beijinho.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Concordo. Não seria eu. Seria uma outra Mar:) Adorei e apaguei por completo aquela primeira impressão. Bom assim. Gostei dessa formulação. De se ter vontade de Barcelona com a mesma urgência de mousse de chocolate. Só tu:)
      Gosto muito do som dos The Libertines. Tem uma decadência e um "quero lá saber" que me dizem muito. E gostei dessa tua outra hipótese. Guardei. Obrigada a ti.

      Beijo.

      Mar

      Eliminar
  3. Mar,

    Não conheço Barcelona, está numa lista de intenções onde também está Paris, o Porto e sushi. Coisas que deixei (mas não deixando), para o momento certo. Gosto dessa maneira de colaborar com o destino. Não vou por ir, vou quando sinto que é altura de ir. Coisas de cada um, enfim.
    Nota-se no decorrer do texto a leveza das férias sim, nota-se muito. O próprio desencadear das palavras é feito de uma delicadeza especial de quem está na vida da sua maneira certa. A de cada um, lá está. Gosto muito.
    Ainda assim um traço nítido de tristeza que compreendo bem.
    Quem pertence à vida e ao mundo, neste momento da história, não consegue estar completamente feliz.
    Um beijinho,

    Jo

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá Jo,

      Temos sempre essas listas de intenções. Mais ou menos longínquas. Mas sim, à espera do(s) momento(s) certo(s). E ir por ir, fazer por fazer, ler por ler. É um registo lamentável, creio. Como se a vida se limitasse a pormos "vistos". Seja como for, há esse dado de que falou. Coisas de cada um.

      Barcelona foi uma cidade adiada. Creio que tinha receio de não ser capaz da paixão, de não a entender. No meu registo e no meu tempo, amei a cidade. Respirei-a, apesar do calor.

      Permiti-me dois dias de intervalo, perto do final de semana. Foi bom assim. Estou a trabalhar a um ritmo intenso outra vez e está muito calor. Mas bem. Está tudo bem. Gosto dos contrastes que a vida nos permite. Das partidas e dos regressos.

      A minha tristeza é ácida, Jo. Extremamente ácida. Creio que a percebe. Tenho lido os seus posts no Facebook. Muito bem escritos. Muito bem respirados. Muito lúcidos. É bom que o Facebook me permita coisas como os seus textos. A maior parte das vezes, aquela plataforma parece servir para deixar um lastro irreversível de matérias que deveriam ser só íntimas. Coisas de cada um, outra vez. Mas gosto sempre de a ler. Obrigada.

      Um beijo para si. Boa semana.

      Mar

      Eliminar

AddThis