Solstício de Inverno*



















Quando hoje todos os relógios do hemisfério norte marcarem as 22h23m, começará o Inverno. O dia mais curto do ano. A noite mais longa do ano. Como quisermos dizer ou pensar. Mas nesse momento tão exacto, e independentemente de tudo, o início da estação mais fria no nosso lado do mundo. Qualquer coisa em nós que sempre quer o sol e as estrelas e o céu e tudo o mais que é da ordem das alturas. Porque há um calendário universal, cronológico. E há outros. Muitos outros. Eu gosto do equilíbrio entre o calendário dos astrónomos e o calendário dos celtas. Danço entre essas duas dimensões, creio. E não há solstício ou equinócio que eu não assinale. Cada um com os seus significados interiores, cada um com os seus rituais exteriores. E se no Solstício de Verão procuro a frescura da água corrente que estiver perto de mim e se nela deixo ir pétalas de flores e bocadinhos de papel com coisas que são para seguir caminho para longe, no Solstício de Inverno procuro a luz, o fogo. E assim, a noite mais longa deixa de ser o lugar mais escuro. É preciso abraçar o Inverno. É preciso deixar que o Inverno nos abrace. Não deixar que o frio e os dias escuros nos impeçam de abraçar uma estação nova, de nos sentirmos envolvidos, parte de um fluir ancestral e inexorável.
No Solstício de Verão, a celebração é lá fora. Há grinaldas de luzes nas minhas árvores e nas heras que crescem (quase) livremente e muitas velas na mesa, nos muros do jardim. No Solstício de Inverno, tudo acontece dentro. Há ramos verdes pela casa toda. O jantar é aconchegante, a celebrar as coisas que a terra dá na estação fria. Há (ainda) mais velas acesas, (ainda) mais luzes. A par da noite de Santa Luzia, é a noite que mais invoca a luz. E claro que sei que nada muda por cumprir cada um destes rituais. Em mim, no mundo lá de fora, no que já aconteceu, no que está para/por acontecer. Claro que sei isso. Mas o ponto é que não é para mudar nada. O ponto é que é tão bonito por si só. Basta-se. Não é preciso religião nem culto nem ideologia ou movimento. É tão-só o tempo a passar a cada estação. As coisas têm sempre o significado muito pessoal que lhes quisermos conceder. E eu gosto dos meus significados, dos meus rituais, dos meus encantamentos e das minhas ilusões. Muito. São quentes. Respiram. Têm (muita) vida dentro. Fazem-me feliz e às pessoas que estiverem comigo. E isso basta e é tanto.
Com as imagens soltas das luzes, das coisas a acontecer na casa, três livros. Este. Sobre quem escreve, maravilhosamente escrito por Javier Marías. E este. Sobre livros que ficaram em suspenso, que não chegaram a ser, que desapareceram. Li-os como sempre leio tudo o que não é ficção: durante o dia, em intervalos, bocadinhos de tempo entre coisas. Não é preciso ler de seguida, sequer. No livro sobre escritores, fui logo ler o capítulo dedicado a Oscar Wilde e só depois vieram os outros. Aos romances fico irremediavelmente presa, custa-me interrompê-los por causa da vida a acontecer durante o dia. Por isso, ficam guardados para o silêncio das noites. Foi o que aconteceu com o Grandes Esperanças, de Charles Dickens. Aconteceu querer relê-lo. Lemos as mesmas coisas de maneira diferente. Creio que o li melhor, agora. E não deixa de ser irónico, porque o estudei (muito) na faculdade, a cruzá-lo com esta adaptação ao cinema. 
Para abraçar o Inverno, a receita que fica hoje é de uma daquelas sopas que aconchega desde o primeiro momento. Deixei-a ontem aqui, neste meu outro lugar, junto de coisas do último dia de Outono. Um creme substancial, profundo, de dias frios. Perfeito para dar as boas-vindas à estação que hoje começa. Assim como esta cerveja artesanal. Uma cor linda, um sabor com camadas, com notas de fundo que persistem. E que venha o Inverno, então.  

Creme de cogumelos, aipo e bacon

1 cebola (grande) + 1 talo de aipo + 1 dente de alho + 2/3 batatas (médias) + 2 cenouras + 10 cogumelos marron + sal, azeite, bacon, coentros, pimenta preta q.b.

Numa panela ao lume, a cebola, o alho, o aipo e um fio de azeite. Uns segundos depois, acrescenta-se as batatas e as cenouras. Cobre-se com água, um pouco de sal e tapa-se, deixando-se ferver. Reduz-se o lume e deixa-se estar uns 15 minutos. Depois, os cogumelos. Deixa-se estar 10 minutos. Decorrido este tempo, passa-se com a varinha mágica. Rectifica-se de sal e de azeite e deixa-se apurar durante uns minutos. Na altura de servir, bocadinhos de bacon, previamente passados numa sertã, pimenta preta moída na hora e coentros picados. 

A música é esta. Da banda sonora do filme a partir do livro de Charles Dickens. 


5 comentários:

  1. Tão bonito o teu post cheio de luz. Que ela nunca nos falte, em nenhuma estação!
    Um beijo, com carinho.
    Ilídia

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    1. Obrigada, minha querida. Sim, em todas as estações.

      Um beijo grande e muito carinho para ti também*

      Mar

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  2. Sempre límpidos os textos, as fotos, as cores. Particular gosto, diferente, que se destaca nos muitos blogs sem alma que por aí andam. Anoto todas as suas sugestões de música e leituras boas. Conheço muitos daí me identificar tanto com este blog discreto e calmo mas cheio de sabor. Muito obrigada pelo prazer que me dá em poder ler os seus textos e poder anotar tantas e tão boas sugestões. Espero que continue. Festas Felizes.

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    1. Também límpidas, estas suas palavras. E lindas. E gratas. Muito gratas. Este meu sítio fará 10 anos para o ano. Começou porque foi criado por um colega de trabalho, cansado de me ver passar receitas em papéis, quando as pessoas me pediam. Lembro-me de ir ao Google ver o que era um blog, para ter ideia da minha ignorância:) A génese foi essa. Foi-se transformando numa espécie de morada, de casa onde gosto muito de estar. Isto para dizer que sim, que é para continuar. Com essa alma e com essa calma de que falou e que me são essenciais.
      Obrigada a si, pelas palavras. Pelos bons desejos. Festas felizes para si também.

      Mar

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