Simplicidade em quatro andamentos.











Para fazer esta comida, costumava precisar de respirar fundo. Bacalhau com natas é uma daquelas coisas que dava que pensar. Muito especialmente pela sucessão de procedimentos, pelo tempo e também pela quantidade de loiça envolvida, devo dizer. 
Como em muitas outras circunstâncias, achei que podia dar a volta, contornar, encontrar atalhos. Foi assim mesmo que aconteceu. Fui encontrando os meus atalhos e fui fazendo um caminho. 
Depois de muito amadurecimento, a minha interpretação de bacalhau com natas, mas numa versão "a abrir", por ser relativamente rápida. Quase que dava para pensar que é uma daquelas coisas que toda a gente sabe fazer e que, por isso, não deveria justificar um post. Mas eu acho que há um sentido qualquer em ir deixando as maneiras mais simples, as receitas mais pedidas, aquelas que estão ao alcance de uma ida quotidiana ao supermercado mais próximo. 
Esta é uma das minhas comidas mais gostadas. E, apesar de se chamar "bacalhau com natas", acaba por ter muito pouco desse segundo ingrediente. E o sabor acaba por ser tão leve. Uso aipo e cenoura ralada. Cebola e alhos picados. Uns apontamentos vermelhos de pimento. A nossa vontade interior de ir dando cores às coisas, se calhar. E nunca fica nada para contar a história. Esta comida é tão amada, que desaparece sempre. Como me parece ser do género de não precisar de grandes adornos, sirvo com cenoura ralada bem fresca e sem lastro de tempero. Cada um tem uma chávena de chá junto ao prato, para se ir servindo. Um detalhe como outro qualquer, mas de que todos parecem gostar, depois de anos desta receita. E isso é bem lindo, creio. Gostar tanto e tão reiteradamente de algo aparentemente sem novidade, previsível. Uma declinação possível do amor.  

Bacalhau com (poucas) natas descomplicado e com sabor a aipo e a cenoura
Quantidade para 4 pessoas
NB: Isto é rápido se anteciparmos algumas coisas ao gesto de acender o lume. Primeiro, as batatas partidas em palitos para fritar. A cebola, os alhos, o aipo, o pimento e a cenoura. Tudo picado e/ou ralado. A seguir, é como se fosse mesmo uma receita em quatro andamentos.   

2 lombos de bacalhau (grandes) + 1 cebola (grande) + 3 dentes de alho + 1 folha de louro (sem a nervura do meio) + metade de um pimento vermelho + 1 talo de aipo + 1 cenoura ralada + 4 batatas + 1 pacote de natas + 800 ml de molho béchamel + azeite, sal e queijo mozzarella q.b.

1. Primeiro, coze-se os lombos de bacalhau. Assim: leva-se ao lume em água sem sal. Quando começar a ferver, desliga-se de imediato e deixa-se estar 10 minutos. Decorrido esse tempo, retira-se, desfaz-se em lascas e reserva-se. 

2. Ao mesmo tempo, as batatas. Cortadas em palitos, mergulhadas em água fria durante uns cinco minutos. Depois deste tempo, seca-se num pano. Vão a fritar em óleo quente, retira-se para papel de cozinha e reserva-se. 

3. Enquanto as batatas fritam, o molho béchamel. Assim: 800 ml de leite, uma colher (de sopa) de manteiga, uma pitada de sal e de pimenta preta. Leva-se ao lume e, assim que o leite der sinal de começar a ferver, umas três colheres (de sopa) de Maizena (uso Express). Mexe-se até ficar bem cremoso e retira-se do lume. 

4. Por esta altura, é tempo de levar as coisas picadas ao lume. Tudo ao mesmo tempo, num refogado leve. A cebola, os alhos, o pimento, o aipo, a cenoura e o louro. Por cima, a folha de louro dividida ao meio e um fio de azeite. Deixa-se estar durante três minutos. A seguir, as lascas de bacalhau, as batatas fritas e o molho béchamel. Envolve-se e acrescenta-se as natas. Tempera-se com sal, vemos se está ao nosso gosto e transfere-se para uma cerâmica suficientemente bonita para ir depois à mesa. Vai ao forno a 180ºc durante 15 minutos. Decorrido este tempo, retira-se e cobre-se com queijo mozzarella. Vai novamente ao forno, até que o queijo fique gratinado. Serve-se e deixamos acontecer o resto da alegria. 

O vinho da primeira imagem tinha mesmo de estar associado a uma comida tão amada. As minhas duas castas preferidas, nisto dos brancos. Encruzado + Malvasia Fina. O Dão, a fazer um caminho muito consistente. Pedra Cancela em versão clara. Uma alegria por si, este vinho. Deixo coisas mais técnicas aqui, que eu sou do género de gostar ou não. Nunca consigo explicar muito bem por que é que gosto muito de um vinho e por que é que não gosto nada de outro. Só sim ou não, nisto dos vinhos. 

A música é esta porque às vezes, é preciso dançar sobre o assunto. Esta é bem nesse espírito. Para uma pessoa linda que precisa de dançar sobre o assunto, a música. 


4 comentários:

  1. Também para mim bacalhau com natas sempre foi "aquela receita complicada e trabalhosa", mas de vez em quando faço a minha receita a dobrar e congelo uma parte e, mais tarde é só levar ao forno.
    Hei-de experimentar a receita da Mar.
    Uma boa semana.
    Bjs
    Ana

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    1. Olá Ana,

      Mesmo assim. Cheia de tarefas, esta receita. É um clássico e creio que todas as casas/famílias terão uma versão própria. Esta foi sendo a minha maneira. Um processo. Fico feliz por ter escrito que um dia tentaria esta hipótese. Mas sabe, o meu espirito é como o dos budistas, nisto das receitas. Eles dizem que não precisamos de mudar de religião e eu digo que não é preciso mudar a sua receita:) faça-a muitas vezes e seja bem feliz.
      Da próxima vez, faço isto a dobrar e congelo, seguindo esse conselho. Obrigada.

      Um beijo.

      Mar

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  2. Até respirei fundo depois de ler a receita ;). Nunca fiz! Não faz parte das receitas de casa da minha mãe nem da minha. Aquela mania de fugir às natas. Mas já provei umas versões assim leves que me caíram sempre muito bem (e adoro!...). Mas a ideia desses passos todos de facto desmotiva um bocadinho... As imagens da sequência toda estão lindas. Poemas visuais ;)
    Babette

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    1. :) Parece assim, eu sei. Mas não é mesmo. Se tiveres as coisas todas a jeito e prontas, é como se fosse uma composição. Em todo o caso, isso não interessa nada, que acabei de te prometer que faço isto da próxima vez que vieres cá:) A minha receita tem poucas natas, que eu sei que tu não gostas assim muito. Eu respeito muito essas objecções. Eu não como coisas com massa folhada há anos. Cada um com as suas questões.
      Nunca pensei que as imagens da sequência poderiam ser apelidadas de poemas visuais:) Eu não levo jeito para produções ou assim. Mas acho que a comida, só por si, pode ser linda. Mais ainda, se tiver boas memórias associadas.

      Um beijo.

      Mar

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