O melhor dos argumentos.






Penso muitas vezes no tal melhor argumento. No que é que me vai movendo. Por esta altura, há muitos dados que tenho já como adquiridos e uma grande parte não augura nada de muito bom. As nossas vidas são feitas de capítulos. São assim como os livros. Só que nisto de viver, nós não sabemos o número da última página. Por isso é que vamos deixando que a vida se escreva ou procuramos escrevê-la, quando ela nos permite essa liberdade. Mesmo com os tais dados adquiridos, eu acho que o amor é sempre o melhor argumento. 
Com esta comida foi assim. A primeira vez que fiz isto foi por causa de um tio que adoro. Diabético. Do género disciplinado. Do género de não abrir excepções às orientações médicas. Nas horas que antecederam esse jantar, apliquei-me a ler coisas sobre a diabetes e sobre os ingredientes bons/maus. Há o banco bom e o banco mau, não é? Neste domínio também há os ingredientes bons e maus. Distraí-me um bocadinho e tudo, que o tempo foi passando. 
A verdade é que eu queria fazer um jantar que fosse para todos os que se sentassem à mesa. Não queria aquela componente de excepção, fazendo comida específica para o meu tio. Nada disso. Nessas minhas deambulações prévias, aprendi que não há assim tantas restrições quanto isso. E aprendi também que a minha ideia inicial de fazer o meu camarão com molho de tomate e gengibre estava tão certa, de boa. Duas coisas boas para as pessoas mais doces de todas, que têm mais açúcar no sangue. Camarão e gengibre. Dois bons argumentos para o melhor de todos os argumentos. Faz-se assim como na receita. E sim, o melhor dos temperos é o amor. Nunca falha. Até mesmo quando nos corre mal e tudo. Mas se foi feito com amor, estará sempre certo. É o que eu penso. Não obstante tudo o que já correu mal. Ainda penso assim. Não sei como, mas sim. 
Neste dia, o meu tio abriu uma excepção e pediu para repetir. O prato principal e o caldo que já partilhei neste post. Fiquei daquela maneira: feliz:) 

Camarão com molho de tomate e gengibre

25 camarões + 1 cebola (média) + 3 dentes de alho (esmagados, com um pouco da casca) + 1 folha de louro (sem a nervura que faz mal ao coração) + 1 pimento vermelho + meio copo de vinho branco + 1 pacote deste tomate + 1 colher de sopa de gengibre ralado + sal, azeite e coentros q.b. 

Primeiro, coze-se os camarões em água a ferver, com sal e uma rodela de limão. Deixa-se estar cinco minutos e retira-se, reservando a água para o caldo, se assim o quisermos. Reserva-se até arrefecerem o suficiente para serem descascados. Assim que estiverem frios, retira-se as cascas e deixa-se estar. Entretanto, leva-se ao lume a cebola, os alhos, o louro e o pimento verde cortado grosseiramente, num fio generoso de azeite. Assim que a cebola começar a ficar translúcida, acrescenta-se o vinho e deixa-se evaporar. A seguir, o tomate mágico e delicioso, um pouco de sal e de coentros. Colocamos a tampa na panela e deixamos que tudo aconteça durante cerca de dez minutos. Decorrido esse tempo, junta-se os camarões, a colher de gengibre, acrescenta-se um pouco de água, se necessário e deixa-se estar mais cinco minutos. Verifica-se o sal, acrescenta-se mais coentros picados e serve-se. Neste dia, a companhia foi arroz de molho inglês com ervilhas, bróculos muito verdes e este vinho. Tinto, como todos à mesa quiseram.  

A música é electronicamente doce. Disclosure em versão Flume. 


12 comentários:

  1. Tão bonito ;) Tão carinhoso fazer comida a pensar em alguém. Nos gostos, nos ingredientes de que não se aprecia ou do que, neste caso, não faz mal. Isso é amor. Esse é sempre o melhor dos argumentos, como dizes. E faz com que no fim tudo esteja certo. Já comprei o molho inglês para experimentar fazer o teu arroz! Fica, assim, tão apetitoso ;) dá vontade de provar! Isso e o camarão no seu belo molho de tomate e gengibre. Que belo prato!
    Babette

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    1. De uma maneira ou de outra, a comida é sempre feita com o pensamento em alguém. Neste caso, no meu tio amoroso. É assim "da paz", ele.
      Este arroz foi uma daquelas minhas descobertas felizes. E completamente sem rede. Nunca mais se comeu arroz branco, aqui em casa. Sempre com este tempero que faz com que perguntem sempre o que é que tem de especial. Molho inglês:) Que te/vos saiba bem, se sim.

      Um beijo.

      Mar

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  2. Emocionei-me ao ler e pensei que realmente isto é que é a verdadeira integração, a que se faz com amor e carinho.
    Experimentei o caldo com camarões e gengibre (condimento que estamos a aprender a apreciar) e ficou aprovadíssimo.
    Obrigada.
    Ana

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    1. Olá Ana,

      Comentário lindo. E sim. Os ingredientes principais acabam por ser mesmo esses. Na comida e em tudo o mais. Quando não, está profundamente errado.
      Fico muito feliz por ter gostado do caldo de camarão com gengibre. É uma daquelas coisas pacificadoras, esse caldo. E o gengibre é um ingrediente quase mágico. Faz um bem enorme.

      Muito obrigada.

      Mar

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  3. Olá Mar,

    O melhor dos argumentos, sem dúvida!

    Fazer comida para "encher a barriga" é muito diferente de fazer comida para Aquela(s) pessoa(s)!

    Todo o carinho transparece!

    Sei disso muito bem. Naqueles dias de maior pressa ou menos paciência, falha sempre alguma coisa.

    As emoções também temperam.

    Um beijinho do Algarve, em pleno Outono

    Sandra Martins

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    1. Olá Sandra,

      Comida-combustível tem um espírito diferente. Não desvalorizo nem nada que se pareça com isso. Mas isso não me impede de achar que é sempre tudo tão melhor com aquela dose de paixão, de amor. Se pensarmos bem, em tudo na vida.
      E os dias apressados em que parece que tudo falha também são feitos desse tempero que muda tudo.

      Outro para si. Outono pleno, sim.

      Mar

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  4. Mar,

    O meu dia a dia faz-se com pessoas doentes. E por isso este post pôs-me a chorar.
    Estava a ler e pensei como seria maravilhoso todas as pessoas doentes receberem amor do tipo do seu: do que nasce daquilo que é autêntico. E de como, seguramente, seriam mais felizes, porque o amor é tudo.
    Abençoadas mãos as suas. A sério.
    Um grande beijinho.

    Jo

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    1. Olá Jo:

      Eu não queria isso de chorar. Mas acho que sim, que há muita falta de amor. Até que sim. E é tudo tão melhor, com esse ingrediente que muda tudo.

      Abençoadas mãos as suas, que cuidam de pessoas doentes. Obrigada pelo que escreveu, Jo.

      Um beijo grande para si.

      Mar

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  5. Mar,passei para conhecer seu blog,na verdade queria tet feito essa visita ha mais tempo,e adorei! Compartilho totalmente da sua linha de pensamento e conduta com relaçao a vida e pessoas. Seu cantinho é, de fato, uma grata surpresa!
    Li seu comentario no Acre e Doce e la voce comentou sobre seu filho ter estado doente,entao espero que ele tenha se curado e que esteja bem.
    Voltarei mais vezes,pois realmente seu cantinho é muito agradavel e tem otimas dicas. Beijinhos,Katia.

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    1. Olá Kátia:

      Bem-vinda, então:) E obrigada. Muito carinhosas, as suas primeiras palavras aqui no blog. Fiquei feliz.
      Esteve doente, sim. O meu filho teve uma semana bem complicada. Mas já está recuperado e pronto para retomar as rotinas dele.

      Um beijo para si.

      Mar

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  6. Estou tão de acordo contigo :) O Amor é mesmo o melhor argumento. E a dedicação que puseste nesta refeição para o teu tio mostra muito Amor. Pensaste num prato que ele pudesse comer sem culpa e que pudesse ser apreciado por todos. E quem resistiria? Parece delicioso.

    Um beijo,

    Ilídia

    PS: Fiz ontem artisan bread. Lembrei-me de ti ;)

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    1. Uma daquelas verdades que parece meio batida. Mas é água, como todas as verdades. Ele adorou e repetiu e tudo. Amanhã vem cá jantar outra vez, com a minha Tia Beca. Já estou a pensar em mais coisas:)
      Eu também me lembro sempre de ti, quando faço essa massa:) Mesmo bom que tenhas falado disso, lá atrás.

      Boa semana. Um beijo.

      Mar

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