Presente no Futuro.
































2030 imaginado, perspectivado, antecipado, projectado. Em Setembro de 2012. As interrogações são abstracções necessariamente. Muitas, as interrogações. Perguntas a serem pretexto para o presente. Num presente com estes números: 14 e 15/09/2012.
Lá fora, as pessoas na rua. A cidade cheia de inquietações à solta. Lá fora, uma luz que só é possível em Setembro. Ali dentro, as mesmas inquietações. Os mesmos medos. Uma profunda humanidade em cada um dos nossos gestos. Uma profunda humanidade no que aconteceu durante dois dias no CCB. Uma profunda humanidade no que aconteceu nas ruas, ontem à tarde. Pessoas a fazer coisas. Pessoas a pensar nas coisas. Pessoas a tentar. Dá para ser de outra maneira? Dará para ser de outra maneira? Independentemente do que estiver ainda por inventar que nos magoe ou que nos faça ter medo do que está por ou para acontecer. Independentemente de tudo o que ainda não foi, as palavras de Tolentino Mendonça, a propósito da imortalidade: "o gesto de abrir a mão e fazer o bem, é infinitamente melhor." Muito, disso. Mais, disso. Isso, em vez de cerrar os punhos e escolher a maldade. Isso, em vez dos "discursos egoístas" de que falou Pacheco Pereira e que nos fazem olhar para cima, para os lados com vontade de polarização, de antítese.
O meu filho esteve comigo. Assistiu a tudo. Esteve comigo num futuro que será mais dele do que meu. Terá 25 anos em 2030. A mesma idade que eu tinha quando ele nasceu. E o presente dele foi tanto. Viajou de comboio pela primeira vez. Atravessou uma cidade em convulsão a dizer adeus às pessoas. Recíprocas, as pessoas. Também a dizer adeus. Experimentou uma felicidade inqualificável a brincar com um repuxo de água, num jardim.
Com as memórias que conseguem ser ditas, o continuar. Passa por coisas tão pequenas e imperceptíveis como esta, o continuar. Fazer uma massa que apazigua. Para um jantar no centro de tudo o que aconteceu em dois dias. Numa casa que me acolhe com um abraço e carinhos no cabelo. O importante era fazer um jantar para podermos estar todos juntos. O importante era arranjar lírios brancos para a mesa. No fundo, acaba tudo por fazer sentido. Disseram que cada um dos nossos gestos é que pode fazer toda a diferença. Disseram que "a vida é dom" e que o vislumbre da imortalidade passará por sentirmos isso como uma verdade interior. E tudo a acontecer. Tantas pessoas nas ruas. A reclamarem o direito de serem entendidas como pessoas. A lembrarem a quem de direito que a história é capaz de não ser bem como a tentam desenhar nos gabinetes fechados.
O tempo é disto. E é agora. O tempo é de estarmos conscientes. De não nos alhearmos e dizermos que estamos "fartos". Alguém se encarregará de pensar e decidir por nós, se assim for. Por isso, sim. Comida e mesas e beleza. O que houver para viver. Sim a isso. Mas não de costas viradas para a restante realidade. Ela está aí. Numa rua qualquer. Num sítio onde nos digam "pára para pensar" e não "para para pensar", segundo a grafia nova que esventra a Língua por decreto. Enquanto isso tudo, as palavras. Os gestos. Tudo o que somos. Tudo multiplicado. A ver se adianta para alguma coisa.
Massa com molho de tomate
1 embalagem de tagliatelle + 8 tomates + 4 dentes de alho + 1 cebola + 1 pimento verde + 10 azeitonas descaroçadas e cortadas em pedaços + 1 colher (de chá) de açúcar + azeite, sal + orégãos + lascas de Parmesão.
Coze-se a massa em água, sal e um fio de azeite. Assim que estiver pronta, passa-se por água fria corrente e reserva-se. Entretanto, leva-se a cebola, os alhos e o pimento ao lume, em azeite. Junta-se os tomates cortados em pedaços e deixa-se cozinhar durante dez minutos. Decorrido este tempo, tempera-se de sal, junta-se o açúcar, as azeitonas e os orégãos. Mais dez minutos ao lume e a massa, no final. Bem envolvida no molho, para ficar bem harmonizada. No momento de servir, mais orégãos e as lascas de Parmesão que cada um quiser no seu prato de massa.  
Espargos verdes feitos pelo Nuno:)
Corta-se os espargos com a mão, no fundo do talo, eliminando-se a parte branca. Numa frigideira sem nada e previamente aquecida, coloca-se os espargos. Quando estiverem ligeiramente tostados (mais ou menos 10 minutos), rega-se com um fio de azeite e tempera-se com sal. E está. Espargos à maneira do meu primo Nuno.

10 comentários:

  1. Olá Mar:

    Já há algum tempo que não passo por aqui. Calhou ser hoje...

    Estive na rua, no sábado. Pela primeira vez. Como portuguesa, cidadã, filha, irmã, profesora. Tinha de ser. Pelo presente e pelo futuro. Comovi-me muito com o civismo e a serenidade de tudo, apesar dos olhares graves de preocupação. Tive tanto, mas tanto orgulho de nós...

    As minhas palavras de ordem vieram de um dos nossos poetas, Mario Cesariny:

    Queria de ti um país de bondade e de bruma/Queria de ti o mar de uma rosa de espuma

    É tanto isto que eu desejo. Vamos ter esperança...
    Um beijinho para si e para o seu filho,
    Marta
    Leça

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  2. Acabou por acontecer a manifestação espontânea das pessoas, no dia em que o Presente no Futuro foi falado, pensado, onde estiveste e que tão bem me contas aqui e contaste já, com os pormenores tão merecedores de serem contados. Coincidiu, complementou. Tornou mais.
    A cidade cheia no 15 de set, e tu por lá também, com o António, um menino a crescer, que a vida é dom !

    Rica massa :)
    Um beijo !
    da Pipinha

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  3. Tinhas-me dito que talvez hoje saísse um post. Vim espreitar :)
    Estes dias têm sido de união, de reflexão. Chegaram-nos imagens comoventes de um povo que luta pelo futuro. Depois de anos de alheamento, as pessoas voltaram a unir-se para pensar no futuro. Esperemos que tudo isto valha a pena. Que os nossos filhos fiquem bem. É o que todos desejamos. E entretanto, fazer o bem, com o que está ao nosso alcance: um sorriso, uma refeição, um carinho, um post como este. Os teus posts fazem-nos bem :)
    Momentos muito especiais, os que viveste com o teu menino.
    Um beijo para ele, que andou de comboio pela primeira vez. E outro para ti, que lhe proporcionaste experiências das quais não se esquecerá.
    Ilídia

    P.S.: Gostei muito da minha nova escola. E dos alunos. Já não me lembrava como era dar aulas a alunos de 12 anos. Acho que tinha saudades :)

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  4. O futuro a existir no presente. Tão simbólico. Tão mais importante em ti, que tens assim uma aversão em projectar muito lá para a frente. Talvez seja só no que te diz respeito, que quanto ao resto, e pensando em voz alta, é bom perceber os rumos. E o que podemos fazer para corrigir ou inverter trajectórias. Nesse dia, curiosamente, o presente estava bem aceso. Que consiga corrigir. Inverter. Unir. Avançar. É disso que precisamos. Isso e massa de legumes com espargos, claro ;)
    Babette

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  5. O primo Nuno Oliver agradece humildemente a referência aos seus singelos espargos e já agora aproveita para realçar o facto "d'amar" ter voltado a degustar essa iguaria, arredada desde a gravidez. Espero que tudo tenha voltado ao normal, em termos de gostos e que o "futuro não seja uma fatalidade" no fundo de um túnel, mas uma luz carregada de esperança e alegria...
    Bjs,
    Primo Nuno

    P.S. Primo Vasco, não tens que agradecer..., ahah! E viva o espargo verde!

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  6. Olá Marta:

    Os nossos lugares afectivos vão sendo assim construídos. Sei que há uma Marta de Leça. Que escreve de vez em quando. Obrigada por esse gesto. Começo por isto. Por achar que isso é uma coisa muito grande.
    E assim. De alguém que se comoveu como eu. Com essa serenidade grave. No sábado, os passos nas ruas terão sido rosas feitas espuma. Também isso adiantará alguma coisa. Penso assim. Melhor, acredito que sim. Essa capacidade não nos é retirada sem mais. E não está sujeita a impostos-surpresa disfarçados de palavras que não querem dizer nada. Mas que têm consequências que devastam. Apesar de tudo, ainda vai havendo uma ou outra palavra que signifique. A isso, então. A esse persistir.

    Esperança do futuro que é o meu filho. E carinho. Para si. Obrigada.

    Mar

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  7. Olá Pipinha:

    Ele pela minha mão num sábado cheio de sol. Naquele contexto irrepetível. Se visses como as pessoas sorriam ao riso e aos acenos dele. Comoveu-me, a alegria dele. Esteve tão bem, ali. Silencioso enquanto assistia ao que estava a acontecer. A meio da comunicação do João Miguel Tavares disse que não entendia por que é que as pessoas se riam tanto:)

    Um beijo para ti. Num futuro próximo, o nosso almoço amanhã:)

    Mar

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  8. Olá Ilídia:

    Uma memória. Mais uma memória. Estava tão feliz. Nos dias antes. No dia. A dizer ao pai que a mãe ia ser só para ele no fim-de-semana:)
    Faz tudo sentido por eles. E pelos nossos alunos. Hoje tivemos uma actividade tão bonita, na escola. Num espaço que todas as escolas deviam ter. Com árvores e uma piscina enorme. Olhei a alegria deles com muita serenidade, por estar a acontecer e ser bom. Custa pensar no que há para lá da escola. Quis o mundo. Para eles. Para os nossos filhos. Queria um mundo inteiro.
    Gosto deste lugar, tu sabes. Gosto de existir aqui. Mas ando cansada. Muito. Fico feliz por ti. E pelos teus alunos com doze anos:)

    Um beijo.

    Mar

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  9. Olá Babette:

    Pensei nisso, quando me inscrevi há uns meses neste encontro. Na ironia. Não consigo um horizonte alargado de expectativas para mim. A minha base não é de anos, mas de meses. Dá para dizer "daqui a um mês, dois". Mais não. Mas consigo uma representação de um futuro colectivo. Consigo querer muito que seja pelo melhor. E pensar. Sempre. Ir ao fundo das coisas. Mesmo (ou principalmente) das que nos tiram o tapete. Essas são as que fazem de nós pessoas mais inteiras. Assim, com o que acontece. Este contexto há-de fazer com que sejamos todos mais inteiros. No que somos. No que fazemos com o que somos. Seja como for, massa e espargos verdes:) Sim a isso e a mesas com flores e pratos azuis.

    Um beijo.

    Mar

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  10. Olá ao meu primo Nuno Oliver:)

    Ficaste com a interrogação da primeira conferência de sábado. Não. Não é nada uma fatalidade. Tirando o óbvio. Foi um momento de luz e de inteligência. Há tanta gente com tempo de antena e que não interessa nada. E pensei que toda a gente devia poder ouvir o Padre Tolentino Mendonça. Um homem raro.
    A proeza da tua versão de espargos verdes, já viste? O Vasco diz que sim, que é para agradecer. E que sabia antecipadamente que íamos adormecer a horas tardias, naquela noite. Conversa prolongada é assim mesmo e pronto:)

    Beijos nossos para todos.

    Mar

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