Amar, não obstante.








Convém dizer isto: não acho que se consiga pacificação vinda de fora. Não naquele entendimento de receituário, pelo menos. Uns dias num mosteiro e fica-se óptimo. Uns dias de retiro e está-se pronto. Nada disso. Parece-me que o processo deve ser sempre interior. O que está de fora dificilmente nos perdoará, se nós não nos perdoarmos. O silêncio de um lugar pode ser ruído, se dentro de nós houver só inquietude. O silêncio. Num convento, o silêncio é diferente. Mais solene. Mais a envolver-nos. Mais a estar em nós. Não sei se consigo dizer bem o silêncio de um convento. Mas acho que posso tentar dizer a paz. De um tamanho impossível de circunscrever. A experiência de ouvirmos bem os nossos passos. De as pedras no chão nos devolverem um bocadinho do caminho que nos fez chegar até ali. Ter o céu como referência. Sem que isso seja uma questão de fé. O céu por estar acima de nós. O céu por ser infinito. O céu com o sol a nascer, silencioso. O céu à noite, com estrelas. Pendentes do nosso olhar. O céu, o sol e as estrelas.
Abaixo do céu, este lugar. Onde a arquitectura integrou bem a ideia do silêncio, da pacificação. A cor a dominar o olhar é o branco. As entradas de luz são generosas onde mais precisamos. E remetem-se ao silêncio, onde necessitamos. Os quartos quase que podiam ser espartanos, de minimalistas. As matérias essenciais. A madeira, a pedra, a lã das mantas, o algodão dos lençóis. E as flores acabadas de colher num dos jardins. Tantas. Fotografadas assim mesmo: no balde onde vieram. Antes de serem compostas num arranjo. Tão a bastarem por si. Tão a acontecerem naquele momento exacto em que o meu olhar coincidiu com elas.
As memórias compõem-se de mecanismos nem sempre explicáveis. Mas determinam uma coisa muito simples: voltar ou não. Sim. Muito. Mais vezes. Lembrei-me que queria ouvir chover naquele lugar. Ocorreu-me que um dia hei-de querer voltar num dia de chuva. E rever. O lugar. E os rostos que são aquele lugar. Faces visíveis de um divino à medida das nossas imperfeições. O sagrado passará muito por isso. Por amarmos, não obstante. No meio do silêncio todo, houve também essa noção. Amar, não obstante. No Convento de Tibães. E nos lugares todos que quisermos.

5 comentários:

  1. Um convento pode ajudar cada um a resolver os seus conflitos interiores, pelo silêncio e pela paz que possui. Por vezes é necessário o silêncio de certos lugares para acabar com o nosso ruído interno.
    Gostei das fotos, dos quartos brancos, dos corredores compridos, das flores. Remetem-nos para o silêncio e para procurarmos a paz dentro de nós!
    Um beijo
    Graça

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  2. Que bonito o teu fim de semana em Braga. Lindas as fotografias, sem excepção. O mosteiro silencioso, a livraria, o verde tão verde. Cada vez mais o teu olhar, pelas imagens. Dá vontade de ir.
    Enquanto eu fazia biscoitos, apressada, para a feira, no meio de uma e outra encomenda. Feliz.
    Um beijo da tua amiga a descobrir um outro agosto, de agenda na mão!
    da Pipinha

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  3. Olá Graça:

    O meu entendimento em relação a estas coisas é mesmo aquele que enunciei na introdução. As questões interiores resolvem-se interiormente, parece-me. Neste género de lugares as coisas surgem-nos mais inteiras. Olhamos para nós sem rede, sem filtros ou elementos perturbadores.
    Este lugar é assim silencioso. E cheio de paz. O mais bonito: as pessoas que lhe dão vida todos os dias. E que recebem quem ali chega de uma maneira indelével.

    Um beijo.

    Mar

    PS: Registei este seu "rasto" carinhoso. Em cada um dos textos. Ainda mais gratidão, Graça.

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  4. A minha amiga atarefada:) Bom sinal. Fico feliz. Já ofereci mais caixinhas dos teus bolinhos, hoje:) Gostaram muito, as destinatárias.
    Obrigada por isso de teres gostado das fotografias. A ver se vão ali, então. A livraria é de ficar horas. De perder ideia do tempo.

    Um beijo para ti, que estás a descobrir este mês de outra maneira.

    Mar

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  5. Sim, que é de nós para nós que as coisas se resolvem. Mas estes lugares por si podem ajudar a centrar os pensamentos. A facilitar essa introspecção. Parece lindo esse convento branco. Acabámos por não falar sobre a comida! Gostaste assim tanto quanto os meus pais?
    Um beijo e boas férias!
    Babette

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