Savor kindness because cruelty is always possible later.
































Foi o lugar onde mais gostei de estar. E não sabia que ia ser assim. Que é a parte mais bonita disso tudo. Antecipei muitas coisas. Muitos lugares. Mas não este. Não a quietude que senti no jardim da última morada da Peggy Guggenheim. O objectivo era o óbvio: ir ver a colecção. Mas não me lembro de quase nada dessa parte. Pollock. Picasso. Pouco mais. Quase uma espécie de sacrilégio, que é dizer isto. Mas sim. Porque o que ficou foi estar cá fora. Por me ter dado conta de que ela gostava tanto daquele jardim ao ponto de querer ser ali sepultada. Que gostava tanto de Veneza, que quis morrer ali. Uma inscrição sóbria. Uma pedra de mármore no chão. Terra. Uma morada eterna, a dela. Achei tão comovente. Tão intenso, este pedaço de vida. Nos jardins. Cheios de flores campestres. Nada de flores complicadas e sofisticadas. Muito de campo. Tive pena de não lhes saber o nome. Um banco de jardim com uma advertência. Para gozarmos a bondade. Porque a crueldade é sempre possível. Mais tarde. Que seja sempre para mais tarde, isso da crueldade. Um pavilhão de jardim que é um misto de café com restaurante. Muito ligeiro. Cheio de luz. Virado para as flores e para as árvores. Um lugar onde comer tartes de morangos selvagens. Perto, uma oliveira feita de desejos. Uma árvore com papéis suspensos. Cheia de desejos, a árvore. Cheia de pessoas, no fundo. Daquilo que elas escolheram deixar de si naquelas folhas de papel.
Esqueci-me dos nomes dos quadros todos. Os nomes dos pintores são difíceis de enunciar. Três, quatro. Pouco mais. Só consegui isto. Ter estado sentada junto ao túmulo dela. Perto da árvore dos desejos. Um bocadinho precioso de silêncio. Com morangos doces e tudo o mais. Queria muito não me esquecer. Por causa daquilo da crueldade ser sempre possível mais tarde. Quando houver, esta memória há-de ser um dos meus refúgios. Sei que sim.

6 comentários:

  1. Mais convergências ;)... Adoro "escolher" os meus lugares alternativos dentro dos emblemáticos e talvez mais tradicionais. Um quadro pequeno e até timidamente exposto de um museu; a vista de uma janela de um outro; o jardim de ainda outro. Colecciono esses fragmentos. Parecem-me mais meus, sabes? E a frase, tão verdadeira. Vou guardá-la, também. Considero-a o presente de uma amiga. Para me fazer ultrapassar os dias que possam vir a ter crueldade.
    Um beijo
    Babette

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  2. Muito lindo esse lugar. Escolher assim, em vez de outra forma. Sentar perto de quem admiramos e deixar tempo passar, e guardar bem o que as pedras nos dizem. Tks pela viagem que assim também se faz minha. E tks pela recordação peggy guggenheim para mim e para o Pedro. Beijinhos!

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  3. Que página tão bela aquela que acabei de ler. Tão precisa neste momento .
    Beijinhos

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  4. Esta frase foi a primeira coisa que quis guardar daquele lugar. Bem à entrada do museu. Uma espécie de mote para o resto. Da visita e da vida, também. Imaginei que sim, que fosse um dos sítios para ires, quando vieres a Veneza. Sem filas, sem agitação. Com muitas flores e comida ligeira. A ver se te lembras dos quadros e dos pintores:) Já que o meu olhar se demorou cá fora.
    E sim, a frase é um presente. Daí ser o título. Daí ser a primeira imagem que acolhe. Uma coisa fundamental, formulada de uma maneira muito essencial.

    Um beijo de boa viagem:) Que já deves estar nas nuvens.

    Mar

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  5. Quis muito trazer-vos um fragmento de lá. Azul. E pesado:) Vão gostar muito dos jardins da Peggy Guggenheim. Da arte, também. Mas acho que também vos imagino cá fora. Sentados ao lado um do outro. Tu e o teu Pedro silencioso e calmo:) Junto da árvore dos desejos que a Yoko Ono ofereceu à Peggy Guggenheim. Gosto sempre que as minhas viagens sejam tuas. São-no desde sempre, não é? Foi sempre assim, por sermos amigas desde há um tempo de que não consigo lembrar-me.

    Um beijo para ti. E outro para o teu Pedro.

    Mar

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  6. Olá minha Lusitana:

    Que o momento não seja de crueldade. Não é isso, pois não? Fico feliz que tenha sido belo para si, o relato da paz nos jardins da Peggy Guggenheim. Kindness. Muito disso para si. Que esteja bem.

    Um beijo da Mar.

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