Os frutos da árvore que não dava frutos.


Por esta altura, a minha árvore que não costumava dar frutos, está perfumada de flores. E tem frutos. Diziam todos que não valia a pena. Que devia ser cortada e substituída. Pedi uma segunda hipótese para a laranjeira. Mais um Inverno. E na Primavera, ela daria frutos. No ano em que o meu filho nasceu. Foi assim. Passou a haver laranjas na árvore que costumava não dar frutos. Bastou esperar que chegasse o tempo dela.
Agora que sim, que surgem todos os anos, apetece transformar os frutos em mais coisas. Em coisas que dêem mais frutos. Um pudim de laranja. Muitos ovos. E laranjas frescas, acabadas de ser apanhadas da árvore que ia ser cortada. Algum açúcar. Um doce muito doce. Daqueles de que as pessoas costumam gostar muito. Por significar um bocadinho de transgressão, talvez. Não sei. Talvez os doces conventuais tivessem essa componente. A de permitirem um bocadinho de transgressão.
Então, o pedacinho de transgressão:) faz-se assim:

400 g de açúcar + 2dl de sumo de laranja + 1 cálice de vinho do Porto + 22 gemas de ovos + 200 g de açúcar (para o caramelo).

Começamos por "forrar" uma forma de pudim com o caramelo e reservamos. Entretanto, leva-se ao lume o sumo de laranja com o açúcar e conta-se cinco minutos a partir do momento em que começa a ferver. Decorrido este tempo, junta-se em fio à mistura das gemas e do vinho do Porto, usando um batedor de varas. Leva-se ao forno em banho-maria durante cerca de uma hora.
Fica pronto, depois. O pudim feito com as laranjas da árvore que não dava frutos. E que ia deixar de existir aqui. É bom saber esperar pelo tempo certo. E é bom quando a Natureza nos lembra isso. Que às vezes devemos aguardar e pronto.  

2 comentários:

  1. É bom acreditar...esperar...dar tempo ao tempo...Não desistir! O fruto colhido tem outro sabor...o da vitória...o do objectivo alcançado!
    A laranjeira que precisava de tempo leva-me aos jovens com quem lidamos todos os dias.Leva-me a um em especial, de quem todos tinham desistido( até os pais). O único aluno que me tirou o sono em tantos anos de ensino! Por isso mesmo; por me sentir impotente perante a desistência,perante a derrota.Dei-lhe, dei-me outras hipóteses...e conseguimos!Pequenas conquistas são para ele grandes vitórias!São para mim motivo de uma alegria diária.É esta a magia de trabalhar com seres humanos!
    Beijinhos
    Emília Melo

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  2. Estou consigo nisso, Emília. Sentimos esse questionar constante. Uma coisa que acontece uma e outra vez. Acreditar ou não. Esperar ou não. Desistir ou não. Dou aulas há sete anos. Não é assim muito tempo. Mas já deu para isso. Para perceber que faz parte acreditar. Que sim, que um aluno desinteressado, que vinha para as aulas sem cadernos, sem caneta, um dia aparece com tudo. Um caderno limpo, para Português. Lembrei-me disto agora. De um aluno meu, o Diogo. Da candura dele, a mostrar-me o caderno novo para a minha disciplina. Uma coisa bonita para juntar a todas as outras que vivemos, por sermos professoras. Tão bonita, a nossa profissão. Tão cheia de magia e de dignidade. Fazemos parte deles. Dos sonhos. Das coisas pequeninas de todos os dias.
    As tais pequenas conquistas de que falou. Que parece que não mudam nada, mas mudam tudo. Podem fazer toda a diferença.

    Um beijo carinhoso para a professora que não desiste.

    Mar

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