Domingo ao final da tarde.


Se o sábado se conjuga muitas vezes no verbo ir, o domingo para mim, significa ficar. Escolher ficar. Mais ainda quando lá fora está sol. Como este domingo, que foi agraciado com uma luz intensa, quase indizível. E então, apetece olhar a luz do sol nas árvores, abrir as janelas, confirmar se as flores estão a seguir o seu caminho. E sim, estavam. Estão. Lá fora, já há jacintos. Apercebi-me ao passar, quando senti o perfume muito forte destas flores. Rejeitadas por algumas pessoas, por serem tão ostensivamente perfumadas. Mas gosto disso. De não passarem despercebidas, de serem evidentes. Pelo aroma. E pelo significado interior que têm para mim. Por me terem ensinado a virtude de aprendermos a cuidar de uma flor. De esperarmos pacientemente que ela desponte e que seja beleza. Por ter aprendido a transformar mágoa em flores perfumadas. Foi isso que os jacintos me ensinaram. Por isso, todos os anos, no início de Janeiro, planto um jacinto. Para me lembrar desse momento fundador em que aprendi a virtude da paciência. De esperarmos que as coisas sigam por onde tiverem que seguir. E assistir. Só. E no entretanto, cuidarmos de algo que seja vida.
No dia de sol que foi este domingo, apercebi-me que os narcisos também estão quase a chegar. E que a minha roseira preferida está repleta de botões pequenos que se vão transformar em rosas generosas e cheias de perfume doce. É a minha Primavera anunciada.
Ao final da tarde, a mesa para o chá. O chá que veio da lojinha no CCB, vendido por uma senhora vietnamita que gostou muito do meu lenço vermelho. Chama-se Dame aux Camélias, o chá. E eu fui buscar camélias ao jardim. Para a celebração da quietude de um chá tomado ao final da tarde de domingo. Para assinalar a vida renovada do meu jacinto. A espalhar-se em aroma pelo domingo.
C'est le temps que tu as perdu pour ta rose, qui fait ta rose si importante.
O ensinamento comovente que fica, de um livro muito breve e muito cheio, lido há anos. Le Petit Prince.

20 comentários:

  1. Ainda tenho muito a aprender com a mãe (Natureza), mas vou "bebendo" os ensinamentos da minha mãe (biológica), que cuida das suas flores e plantas como ninguém, que florescem muito belas no tempo que tem de ser, umas mais perfumadas que outras.
    Se antes as considerava bonitas mas pouco mais, hoje em dia reconheço que têm o poder de iluminar e transformar ambientes, porque têm personalidade própria, e por isso não as dispenso cá em casa.
    Associava a Mar às cores azul, branco e vermelho. Agora também a todas as cores do seu jardim.
    Aceite a flor (em forma de palavras) que lhe dou com carinho.
    Sandra

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  2. Um delicioso e luminoso fim de tarde de domingo. Com o anúncio de uma Primavera que se aproxima. Um chá muito adequado a Fevereiro, com a flor da minha cidade. E uma frase do Livro que usei para tirar muitas frases que povoaram o meu Missal de casamento...
    Babette

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  3. Olá, Mar
    Uma bela mesa numa tarde de domingo. A relação que estabelece com a natureza, que é ao mesmo tempo de cuidado mas também de quem recebe dela ensinamentos. Neste caso, a paciência. Os ciclos que é preciso aprender a respeitar. Gostei muito da sua entrada. Foi a inspiradora para o que escrevi hoje no meu blogue.
    bjs

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  4. Mar
    No meio de um ambiente que ilustra o Belo,será que estou a ver umas asas de anjo compradas na casa das coisas de guardar/acrescentar, em Viseu?
    Boa semana
    Beijinhos
    Emília Melo

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  5. Bom dia Sandra!

    Muito obrigada pela flor cheia de carinho. Num dia de sol. Mais um dia. É engraçado estar associada a muitas cores. Nunca consegui eleger uma cor. Gosto de todas. E adoro vê-las todas juntas. Em ramos de flores e no meu jardim algo caótico. Muito verde. E pontuado por fragmentos de cores. Mais uma vez, obrigada pelas palavras doces. De conservar.
    E um dia cheio de coisas que sejam para conservar. Para a Sandra.

    Beijo da Mar.

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  6. A minha amiga Babette!

    Não sabia que os jacintos eram a flor do Porto. Podes explicar? Nunca tinha ouvido essa referência. E mais pontos em comum. As palavras proferidas por um pequeno príncipe. A propósito das coisas mais belas: o amor, a amizade.

    Beijo da Mar. Cheio de sol.

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  7. Para a Fa:

    Leu-me bem. Mais uma vez. Porque foi esse o motor das palavras. Pensar no que devemos respeitar. Neste caso, a Natureza e os seus ciclos cheios de sabedoria. E a paciência. Uma virtude sempre a aprender ou a reaprender. Muito difícil, a paciência. Mas também isso nos chega pelas coisas mais simples. Como tomar conta da vida que há numa flor. Um ensinamento minimal, reduzido ao essencial.
    Tinha saudades dos seus posts no blog. Habituamo-nos a estas coisas, não é? A ler as palavras dos que nos são queridos. Como a Fa. Ainda que nunca a tenha visto.

    Beijo de bom dia da Mar.

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  8. A Emília Melo plena de sensibilidade. De uma inteligência intuitiva muito grande, muito bela. Sim, são as asas de anjo que comprei em Viseu, na Rústica. Gostei delas de uma forma muito intuitiva, também. E vieram para minha casa. Sem que soubesse ao certo o que fazer com elas. No domingo, estiveram junto a mim e ao meu marido, a assistir a um chá de final de tarde. E hão-de assinalar-se de outras formas.
    A propósito, o meu marido disse-me que ficou encantado e feliz com as referências veladas à obra de Espinosa. E que adivinha em si uma verdadeira espinosana. Tão bom que esteja aí. Aqui.

    Um beijo para si. E que os seus dias sejam lindos.

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  9. Bem Mar, quem se explicou mal fui eu...
    A flor do Porto a que me estava a referir era a Camélia (associação só minha, talvez) referindo-me ao sabor do Chá, e não ao jacinto que já habita o teu jardim! Associo as camélias aos bailes de debutantes do Porto, realizados em Janeiro, em que há muitos bouquets de camélias... só isso!

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  10. Pensei que estavas a falar dos jacintos:) Não tinha ideia dessa associação. Só tenho uma sobrinha que cumpriu esse ritual aí no Porto. No Club Portuense. Mas tem lógica. Nesta altura do ano, são essas as flores por excelência. Embora haja, de certeza, uma outra razão. Vou perguntar à minha cunhada, estou curiosa:)

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  11. Mar:
    No passado domingo fui à Livraria Almedina e resolvi perguntar pelo livro da Ana Teresa Pereira que me recomendou. O jovem que me atendeu, muito entusiasmado, foi-me buscar uma pilha de livros da autora ( todos finos, com poucas páginas) e disse-me que me ia arranjar um, mandava vir de Coimbra. Acrescentou: que bom a senhora procurá-la. É uma das novas escritoras, já li muitos dela e gosto muito. Comentou a seguir, olhos brilhantes: sabe, é que só falam dos OUTROS. Achei muita piada, comprei A OUTRA e aguardo a mensagem que o livro encomendado chegue.
    Bom, aqui o blog da Mar tem muito mais que culinária...
    Beijinhos.

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  12. Desculpema a intromissão a propósito das camélias." O Porto é a pátria das camélias"é uma designação atribuída à cidade pelo escritor francês Georges de Saint-Victor, em 1890.A obra em que referiu ao Porto nestes termos é"Souvenirs et Impressions de Voyage".Ilustrou a sua impressão com a frase " Até nos cemitérios as há". Esta e outras informações sobre camélias podem encontrar-se em www.ascameliasdasjaponeiras.com
    beijinhos
    Emília Melo

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  13. Bem, sempre não era só palpite. É uma associção que tenho desde há muito tempo, mas confesso que não me lembro como me foi incutida. Assim faz mais sentido! obrigada Emília!
    Babette

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  14. Mar:
    Mais um comentário, desta vez para dizer que o pintor Artur Loureiro, de que lhe falei, tem um quadro lindo, justamente " Camélias", entre muitos da cidade do Porto. Mais um motivo para ir ao M. Soares dos Reis...
    Beijinho.

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  15. Olá Lusitana:

    Conheci os livros da Ana Teresa Pereira pelo meu marido. Que comprou "O Rosto de Deus" porque o título do livro tinha a palavra que é fonte de todas as inquietações: Deus. Ele não acredita. Creio que é por isso que lê tudo sobre Deus, sobre a ausência de Deus, sobre o infinito e de como essa pode ser uma representação do divino. Um eterno angustiado. Uma angústia boa, inquieta, curiosa. E depois, ofereceu-mo porque a personagem tinha o meu nome. E depois, li tudo dela. Procurei livros anteriores e espero sempre que haja livros novos. E sim. O senhor da livraria terá razão. Fica a sensação de que toda a gente escreve. Toda a gente publica livros. E no meio de todo esse ruído, há escritoras assim. Espero muito que as palavras dela fiquem em si. E acho muito lindo que tenha ido procurar livros a propósito do blog da Mar. E assim, sou menos virtual.

    Beijo de boa noite da Mar.

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  16. Uma óptima "intromissão", devo dizer. Não tinha noção. Embora intuitivamente tivesse a ideia de ver muitas japoneiras pela cidade. Principalmente nos jardins das casas. Há sempre camélias. Obrigada pelas referências, Emília. Uma boa partilha, esta. Amizade e conhecimento em rede. E graças a si, há agora outro motivo para gostar ainda mais do Porto. Porque é a "pátria das camélias". Das flores que parecem ser feitas de cera.

    Beijo da Mar.

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  17. E sim. Hei-de ir ao Museu Soares dos Reis. Uma falha nunca ter acontecido. Vou seguir as suas palavras. Tal como segui as da Emília, a propósito da Feira de Velharias em Aveiro. E depois venho aqui dizer como tudo aconteceu.

    Outro beijo.

    Mar

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  18. Olá Mar,
    Descobri o seu blog através do blog "Festa da Babete" e ainda bem que o descobri, em dois dias já vi todas os post publicados e adorei, tem muito mais que culinária, tem mtas sugestões em relação a varios assuntos. É desta vez que vou ao restaurante Shis....Gostava também de saber onde costuma comprar as decorações e os espelhos que tem no centro das mesas, que são lindas. Simplesmente adorei.
    Muito Obrigada

    Maria José Duarte

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  19. Boa noite, Maria José:

    Fico muito feliz que tenha chegado aqui. E que isso tenha acontecido através do blog da minha amiga Babette. Agradeço o facto de ter gostado de ler e de ver as coisas da Mar. Apesar de não ser só sobre comida, o meu ponto de partida, este sítio virtual traz-me muita alegria. Como esta. De uma nova visitante. E sim. Vá ao Shis. Um daqueles sítios onde é tudo bom do início ao fim da refeição. Sem pretensões, sem grandes sofisticações, para não nos distrairmos muito do essencial: a comida. O restaurante é muito bonito e há aquele mar todo. À frente dos nossos olhos.
    Em relação aos espelhos, costumo comprar no IKEA. Mas também já vi na Casa. A parte das decorações é um bocadinho mais difícil de explicar. Mas se me disser qual o post ou posts a que se está a referir, terei todo o gosto em dizer de onde vieram os objectos das mesas.

    E muito obrigada eu. A si. Que escreveu hoje pela primeira vez.

    Mar.

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  20. Olá Mar,
    Obrigada pelo seu comentário. Agora já não passo um dia sem consultar o seu blog e continuo a ficar maravilhada, pela palavras, pelas receitas, enfim, por tudo.
    Se for possivel gostaria de saber onde comprou a louça branca que está no post "As mesas que acolhem" dia 10/01/11; e os copos de pé no post "Um espelho de cristais" dia 22/08/10.
    Mais uma vez obrigada por existir um "cantinho" como o seu.

    Maria José Duarte

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