Matéria.


Foi o presente que comprei com mais ilusão. Com mais alegria. Com mais carinho. Quase que deu para sentir as coisas que sentia quando era pequena. Mas quando era ao contrário. Quando os presentes vinham sem que eu soubesse de onde vinham. E eu era pequena. Não é que fosse um presente assim caro. Ou raro. Ou que precisasse de vir de longe. Nada disso. Era só um globo.
Fui ouvindo o meu filho. Atendendo aos sinais. Que queria saber onde era a Guiné, para poder imaginar onde estava a madrinha. E a França, por causa de Paris. Por lhe termos dito que foi a primeira viagem que fez. Mas de que não se lembra, porque era tão ainda de colo. Depois Nova Iorque, que para ele é um país ou assim. Porque quando se chateia, diz que vai sozinho para Nova Iorque. Todos os lugares de que vai ouvindo falar. Alguns com nomes que não consegue dizer bem. E eu ouvi. E guardei segredo do que ia ouvindo. E num dia em que não estava a contar, lá estava o globo que iria ser do António. Veio comigo. E continuou a ser um segredo. Até à manhã do dia de Natal. Era aí que teria de deixar de ser um segredo. A felicidade veio num abraço apertado, do género de despertar mães adormecidas. Ficou feliz só pelo globo, o meu filho. Nem deu conta que havia mais embrulhos. Aquele foi o que fez dele uma criança feliz. E teria sido suficiente, pelos vistos. Mas no momento a seguir, caiu das mãos pequeninas que iam saber onde era a Guiné. Rápido, que é assim que as crianças querem descobrir as coisas. Foi isso. Tinha pressa de ver onde era o país quente onde estava a madrinha. E caiu ao chão. E partiu-se. E não dá para colar.
Um objecto. Matéria. Matéria feita de materiais diversos. Matéria que não era valiosa. Que não valia nada que não pudesse ter um preço. O problema estava todo no que ali não tinha preço. O problema estava nisso. Para não dizermos mal da matéria. Para calar um bocadinho as coisas discursivas sobre o "materialismo". Era matéria, o globo. Mas tão imaterial. Por isto. Houve nele a minha alegria por ter coincidido com o globo perfeito para o meu filho. Depois disso, o carinho de um segredo. Pela antecipação silenciosa da alegria dele. E no desvendar, aquele abraço cedo. Tão feliz, o abraço que me deu bem cedo. Matéria. Só matéria. E não. Que a matéria também somos nós. Os objectos nunca são só isso. São nós. Talvez alguns místicos consigam não ser objectos que digam coisas sobre eles. Mas creio mesmo que nem eles escaparão à matéria irredutível de que somos feitos. Como o globo partido do meu filho. Que é eu. E ele. Que é nós os dois. Num abraço, em contemplação comovida de um globo partido.

Às "minhas" pessoas.








Por esta altura, as "minhas" pessoas andam a preparar-se. Para a noite que consegue ser a mais doce. Acho assim. Que é assim como uma noite de algodão. As "minhas" pessoas não são bem minhas. Há sempre aquela propriedade mais ou menos ingrata dos possessivos. Reminescências menos boas que têm, os possessivos. Mas é que eu acho que as aspas libertam. Acho até que, se pudesse, punha aspas discursivas de cada vez que uso o "meu". Nada disso, que nada nos pertence. Muito menos as pessoas. Daí as aspas, então.
Enquanto as "minhas" pessoas estão a fazer doces de Natal. Enquanto as "minhas" pessoas estão a ir ao encontro de outras pessoas. Enquanto as "minhas" pessoas estão a existir longe daqui, isto. Ficar feliz por imaginar tudo isso e deixar coisas. A última mesa antes da noite de algodão. Um chá com felicidade dentro. Comprado só por isso. Por um rótulo que anunciava a possibilidade de felicidade. E um presente azul. Que é todos os presentes que gostaria de poder oferecer. Às "minhas" pessoas. Com música que não é bem de Natal. Mas que é a música que me ajudou a embrulhar os presentes deste ano. E que está aqui perto, enquanto escrevo Bom Natal. É isso. E é especialmente doce de dizer. Melhor, de escrever. Bom Natal.


A almofada.


























Li sem ler. Registei sem registar. Remeti para mais tarde. Que depois tinha de apontar na minha agenda. Para não me esquecer. Mas esqueci-me. Aconteceu esquecer-me. Disto. De uma almofada. No papel pequenino que ele trazia nas mãos pequeninas, o pedido era muito simples. Uma almofada.
Mas depois houve as outras coisas todas da semana passada. Todas as outras coisas. Todas apresentadas como absolutamente inadiáveis. Tinham mesmo de ser feitas e não dava para ficar para outra altura. E muitos papéis com a minha assinatura muitas vezes. Mais pessoas a dizer se dava para fazer mais qualquer coisa. Que ainda faltava mais uma coisa de que se tinha falado no dia anterior. A essas coisas, o sim. Sim a isso tudo. E o papel pequenino da almofada ficou esquecido. A palavra é esta, que não gosto de eufemismos. Nem de dar sinais errados. Esquecido, o papel com que o meu filho chegou a casa há uns dias atrás.
E mesmo que não tenha uma visão castigadora das coisas. Mesmo que não ache nada que somos capazes de chegar a tudo. Ou que não ache a mínima piada ao que chamo de "mães profissionais".  Ainda assim, a falha. Enorme, inequívoca, inapelável. No dia da festa de Natal, o meu filho não levou a almofada do papel pequenino. Porque a mãe se esqueceu. Porque a mãe andou a preparar a festa de Natal dos alunos. Porque a mãe andou a preencher muitas vezes os mesmos papéis. Porque a mãe andou a ter muitas reuniões que acabavam muito tarde. E a pensar no jantar de terça. E no de quinta. E correu mal, que a mãe esteve mal. Mas ele não. Ele libertou-me, no momento em que lhe pedi desculpa. Assim: "Deixa lá, mamã. Não fiques triste, que eu desenrasquei-me."
Depois perguntou se podia fazer-lhe uma sopa. Esta que deixo hoje. Que fiz para o meu filho. Libertador da mãe.

Creme de Cebola
4 cebolas médias + 1 batata + 2 courgettes + 4 cenouras + sal e azeite q.b.

Faz-se um refogado muito breve com duas cebolas e um pouco de azeite. Aos poucos, integram-se as courgettes (sem a casca), as cenouras e a batata. E água até cobrir os legumes. Junta-se um pouco de sal e tapa-se. Depois de começar a ferver, reduz-se o lume e deixa-se estar vinte minutos. Decorrido este tempo, passa-se muito bem com a varinha mágica, para ficar em creme. Junta-se as outras duas cebolas, partidas em gomos finos. Finaliza-se com um fio de azeite e mais sal, se necessário. E no momento de servir, já no prato, ficam muito bem umas lascas de parmesão.

PS: Para o António. Para quando souber ler.

Reformulação.






De vez em quando acontece assim. Achamos que vai ser de uma maneira e afinal não. Formulamos uma série de coisas. Projectamo-nos de uma certa forma e sai ao contrário. Como aconteceu com uma das minhas amigas. Uma daquelas a quem podemos contar todas as coisas em que sabemos que falhámos. Alguém que nos dá um abraço sem fazer perguntas. É isso, ela. E também esta dimensão nova. Esta reformulação. Este rever de vida. Tinha pensado que a vida ia ser daquela outra maneira. Mas aconteceu um apelo. Que se conjugou com uma série de circunstâncias. E deu nisto. Fazer bolos, bolachas e biscoitos. Todos eles com aquele toque de arte. Aquele que é muito dela, irrepetível. Por esta altura, anda atarefada. Com o cabelo preso num nó. A fazer fornadas de biscoitos que dizem bom Natal. E um bom ano novo. E mais estrelas de gengibre. E asas de anjo a saber a limão. Entreguei nas mãos dela uma parte muito bonita dos meus presentes de Natal. Por saber que as mãos que os vão receber hão-de ficar felizes. E mais doces, também. Sei que sim.
E a reformulação de vida da minha amiga tem um nome: Bolo ao Cubo. Bolos, bolachas e biscoitos. É assim, a tal reformulação. Um lugar onde podemos ir buscar coisas doces. Como se pudéssemos pedir bolachinhas de sortido húngaro a uma mãe num momento. E no outro a seguir, já está. Já há bolachinhas de sortido húngaro. Foi essa a minha primeira formulação de um desejo de criança. À vida reformulada da minha amiga de sempre. Agora, basta só a melhor das sortes. Formular a melhor das sortes, então. E há-de correr bem, que tenho ideia de que os desejos formulados no Natal são mais brilhantes. Uma sorte brilhante para ti, Pipinha!  E música de que gostas:)


Sábado.






























Deixou de ser só um sábado. Por ter sido sábado. Por já ter acontecido. Por ter sido o dia em que aconteceu um almoço há muito projectado. Libertou-se daquele espaço da possibilidade. Por ter acontecido. E para este dia, eu só queria que a mesa fosse assim como um espelho. Um reflexo limpo das coisas que eu queria que a mesa dissesse. Acho que sou melhor a dizer as coisas dessa maneira. De vez em quando, as minhas palavras parecem falhar. Não dizem. Não são suficientes. Ficam aquém. Ou à porta. Não sei. Mas sei que este sábado fez com que me fosse possível reconsiderar. Por ter tido oportunidades menos luminosas para duvidar, talvez. Uma semana difícil pode ter esses efeitos em nós. E a sensação persistente de ter precisado demasiado de ter um exército dentro de mim. E eu não quero isso. Não quero precisar de exércitos. Quero só gostar. Não quero precisar de me defender. De me resguardar. Porque o melhor é dar. Gostar. Acreditar. Não ter medo, no fundo. Não ter medo.
O meu convidado de sábado fez com que eu voltasse a pensar que o mais certo é mesmo escolhermos ser melhores. Darmo-nos e esperar que corra tudo bem. E se não, logo se vê. Logo se vê se precisamos do tal exército. Se devemos ficar quietos à espera que passe. Ou se podemos só pôr uma mesa que queremos que seja um espelho de coisas que brilham sem ofuscar. Eu escolhi esta última hipótese. Havia uma pessoa que queria ver sentada à minha mesa desde há muito. E esse facto determinou que assim fosse. Que a minha mesa fosse dedicada a alguém que significa um mundo muito inteiro. Um mundo que se diz de muitas maneiras. Todas elas muito significativas.
Só para dizer que o mundo é um lugar melhor por saber que nele existe o meu convidado de sábado. Só para dizer que o meu mundo é melhor por saber que ele está. Aí desse lado. A ler-me. E aqui. Esteve aqui. E a minha felicidade só por isso. Por ter estado à minha mesa, no sábado. Obrigada por isso. Pelos livros. Pelas palavras dos livros. Obrigada por sábado.

"Nós só perdemos aquilo que não damos."



Se vivesse perto de mim, seria o que lhe ofereceria hoje. Comida a saber a uma casa de campo no Inverno. Não vive perto. Por isso, à distância, um presente em forma de comida. Muito provavelmente, é aquilo que tenho de melhor para oferecer. A comida. Foi por aí que começou. Aqui. E então, o registo teria de ser também aqui. Pelo primeiro aniversário de uma amizade. Coincidimos. Aconteceu assim. Mesmo que pela ordem natural dos percursos, essa não fosse uma possibilidade. Não andámos no mesmo liceu. Não estudámos as mesmas coisas na faculdade. Não havia amigos comuns ou assim. Nada. Não havia nada que tornasse possível isto de estar a escrever para assinalar a dádiva de uma pessoa como ela. Dizer os afectos. Eu acho que gosto de dizer as coisas. Mas gosto ainda mais de as viver. E tem sido assim. Há um ano que sim. Hoje fica o primeiro ano. E um presente. Por saber que gosta. Por saber que gostaria de ter míscaros para o jantar. Feitos em silêncio num dia de chuva. A pensar que gostava mesmo que pudessem ser para ela. Hoje.

Míscaros para a Babette

1 quilo de míscaros + 1 chouriça + 1 cebola picada + metade de 1 pimento verde + 1 cenoura ralada + 1 colher (de sopa) de pimentão doce + 1 copo de vinho branco + sal, azeite, pimenta preta e coentros q.b.

Faz-se um refogado com a cebola, a cenoura e o pimento. Junta-se depois os míscaros e a chouriça (partida em pedaços pequenos), mais o pimentão doce, o vinho, um pouco de sal e os coentros picados. Fecha-se o tacho e deixa-se cozinhar durante cerca de vinte minutos. No final, se necessário, rectifica-se os temperos. Normalmente, basta moer mais um bocadinho de pimenta preta e salpicar com coentros frescos, mesmo antes de servir. Com pão consistente e um copo de vinho tinto.

Obrigada. Porque a amizade que faz agora um ano me ensinou mais a perceber o sentido real do título deste post. Muito certa, esta formulação de José Tolentino de Mendonça. A ver se nunca me esqueço disto. Isto de lembrar que só perco aquilo que não dou.

A sonhar com um Natal branco.





Podia ser assim. Um Natal branco. Que as coisas de fora fossem brancas. A tentar dizer o essencial, muito possivelmente. O branco permite esse e outros diálogos interiores. Como se desse para escrever o que quisermos. Assim é a mesa que sonha com um Natal branco. Mesmo que até nem seja muito provável acordar com o mundo coberto de branco literal. Ainda assim, a possibilidade muito de algodão. Esta. A mesa que me despertou hoje. Queria que a mesa de domingo a pensar no Natal fosse muito clara. Que tentasse dizer a devoção essencial pela ideia de clareza. Nos domínios mais básicos. E haveria uma cor mais clara? Mais essencial? Mais silenciosa? Mais tudo. O branco é tido como uma espécie de nada. Eu olho para a mesa. E não. Afinal, é capaz de estar lá tudo. Nos seus lugares. Uma casa com as janelas acesas. Peónias brancas. E as asas etéreas de um pássaro. As coisas de que uma cor é capaz. A começar pelo tal sonho muito branco. A começar por isso. E a terminar no que for.

Fora de horas.





O bom das cidades. Apetecer qualquer coisa fora de horas e isso ser uma possibilidade. Não ser uma coisa de esperar que o mundo acorde. Apetecer uma coisa do género bife + batatas fritas + esparregado e isso poder acontecer sem mais. Desta vez, foi possível num lugar que gostei mesmo de saber que existe. No Café de São Bento, em Lisboa. Era tarde. Não é suposto jantar à meia noite. Mas também, os supostos mais os seus preceitos parecem esbater-se mais nas cidades. Pelo menos, é aquilo que vem por intuição. Não importa muito e pronto. E então, uma porta fechada. A seguir, um toque numa campainha discreta. Depois disso, uma visão aveludada em tons carmim. Uma meia-luz muito de filme. Como se fosse um reduto. Fora do que é ou não é suposto. Fora dos códigos todos que temos como seguros. Seja lá o que isso for. Os códigos às vezes só servem para nos desviar a atenção do que realmente queremos. Como aquilo que eu queria, naquela noite. Um jantar tardio. Era só isso. Sentar-me num sítio quente. E ir respirando a memória de um dos concertos que aguardei com mais expectativa. Há tantos anos que queria ir ouvir a música dos Smashing Pumpkins de perto. Há demasiados anos. Na sexta-feira aconteceu. O concerto aguardado. E o que veio depois. Uma refeição que há-de ser sempre a música que trazia em mim, naquela noite. Música que pode ser muitas coisas. Música que pode fazer com que nos apeteça mais o mundo. Eu acho que foi o mais vívido. O que mais ficou. Talvez por não ter ido logo para uma casa transitória. Talvez por ter gostado muito de andar mais pelo mundo cá de fora. Ainda não eram horas de acabar. A ideia persistente era mesmo a de prolongar a música que trazia comigo. O Café de São Bento foi o lugar que me acolheu. E à música. Também havia lugar para isso. Enquanto cumpria um desejo tardio. Muito bem cumprido, que hei-de voltar ali mais vezes. Enquanto não, a evocação. Agora aqui.

PS: O meu carinho aos que estiveram comigo nesta noite. E que fizeram com que ela fosse ainda mais de guardar. Carla e Nuno: estas coisas fora de horas sabem infinitamente melhor convosco:) E ao óbvio. Que por definição é para dizer sem dizer.

Mal conseguir esperar.






Por esta altura, é irreversível. Talvez por não conseguir achar que se deve reservar tudo para aquela noite. Apetece-me que esteja presente no quotidiano. Mesmo que isso não passe por aquelas evidências todas de centro comercial. Pode ser um prato. Pode ser um detalhe tão pequeno como esse. Como estes, que eu sei que não terão sido concebidos para cumprirem o destino primordial dos pratos normais. Mas também. Por que não? Se são tão bonitos? Se podem ser as duas coisas? Contemplados e vividos. Olhados no centro de uma mesa. E usados por cada um dos lugares que se senta à mesa. E cada um desses lugares poder ser uma vela que nunca tenha sido luz antes. Podia ser assim.  
Este ano, as espécies de ensaios para a mesa de Natal. Até à noite das luzes mais quentinhas, até haver uma mesa definitiva de Natal, as que vou imaginando por estes dias. Para deixar ideias. Para registar cada uma dessas tentativas. Que acabam por ser só sinal daquela característica quase infantil. Aquilo do "mal conseguir esperar por". Acho que as mesas que são de Natal em dias que não são Natal são mais isso. Como se fosse possível recuperar vislumbres fragmentários de coisas que temos como irrecuperáveis. Também aqui, agora. E saber que Dezembro é sinal de mesas que se preparam para a da noite que cheira a gengibre e a canela. E que é chá quente bebido a sós. Depois da vida toda que houve à mesa. Enquanto o mundo repousa. A olhar as luzes de uma árvore de Natal. E a evocar a mesa do Natal que está a acontecer.  Mesmo que a esta distância, ainda não saiba como vai ser. Mas o bom disso de não saber como vai ser uma coisa pela qual mal se consegue esperar. Como uma mesa de Natal. Pode ser tão simples como uma mesa de Natal.

Em silêncio.




É um ritual silencioso. Ano após ano, este silêncio. A árvore de Natal é sempre uma espécie de surpresa. Daí ser feita a sós. Mesmo que eu até goste daquele imaginário muito cheio. De ser uma coisa partilhada. E agitada. Com a alegria renovada de que conseguimos ser capazes. Ano após ano. Não acontece assim. A árvore de Natal é o primeiro dos presentes que ofereço. No primeiro dia do mês de Dezembro. E então, ela acontece. Assim no meio de muito silêncio. É assim que ela acontece. Este ano, nasceu de uma pequena morte no jardim. Um ligustro que foi secando. Todos os dias a acabar devagarinho. Todos os dias a esvair-se em folhas caídas. E a sentença. Teria de ser sacrificado. Não ia dar mais nada. Ou talvez não. Ainda havia beleza na árvore perdida. Ainda havia uma possibilidade para aqueles ramos sem vida. E está ali, a árvore sacrificada. Uma luz só. Preenchida com ramos de azevinho e de oliveira. Com pássaros pousados. Uma árvore com asas. Este ano, a minha árvore de Natal tem asas. E na base de tudo, um presépio quentinho. Três luzes brilhantes. Em torno da imagem de um nascimento que pode ser os nascimentos todos que quisermos. E uma casa com as janelas acesas. É que eu acho que o Natal é uma casa. E as coisas todas que uma casa consegue ser. Nesta altura do ano, as casas a que regressamos uma e outra vez, são ainda mais acolhedoras. Ainda mais com as janelas acesas. A ver se nunca nos esquecemos do caminho para cada uma das casas a que regressamos. O caminho que se inicia todos os anos. Até à noite em que as estradas ficam silenciosas. Alumiadas pelas janelas quentes das casas. E em cada uma delas, a possibilidade de uma árvore.

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